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Marisa Monte reina no mar de canções, sons e imagens fascinantes do show ‘Portas’

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Artista estreia turnê mundial em São Paulo com requintado aparato visual e com banda que dá frescor a repertório sem músicas inéditas na voz da cantora. Marisa Monte em momento de beleza do show ‘Portas’
Leo Aversa / Divulgação
Resenha de show
Título: Portas
Artista: Marisa Monte
Local: Espaço das Américas (São Paulo, SP)
Data: 4 de fevereiro de 2022
Cotação: * * * * *
♪ Primeiro show solo de Marisa Monte em dez anos, Portas se abriu para o mundo em São Paulo (SP) na noite de ontem, 4 de fevereiro, com estética encantadora que remeteu ao aparato visual do anterior show solo da artista carioca, Verdade, uma ilusão (2012), estreado em Curitiba (PR) há uma década com base no álbum O que você quer saber de verdade (2011).
Diretor de arte de ambos os shows, Batman Zavareze projeta em Portas imagens – desenvolvidas a partir da série Fundos, da artista plástica Lúcia Koch – que criaram inebriantes efeitos visuais em caixa cênica arquitetada por Cláudio Torres para preencher toda a dimensão do palco. No caso, o palco amplo do Espaço das Américas, cenário da efetiva estreia da turnê mundial prevista inicialmente para ter chegado à cena em 19 de janeiro, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), mas adiada pelos efeitos devastadores da variante ômicron no curso da pandemia de covid-19.
Assinando a direção e a concepção visual do show com Zavareze e com Torres, Marisa Monte reinou como a sereia que emergiu soberana em mar de canções, sons e imagens fascinantes que fizeram o show Portas fluir sem erros ao longo de duas horas.
O requinte visual do espetáculo redimiu o roteiro sem novidades na voz de uma cantora que sempre apresentava surpresa no repertório para o séquito que a segue ao longo de trajetória que soma 35 anos em 2022. A novidade, desta vez, reside mais na sonoridade que diferencia o show Portas do homônimo álbum lançado por Marisa Monte em 1º de julho de 2021, dia do 54º aniversário da cantora, compositora e instrumentista.
Em vez dos opulentos arranjos de cordas que embalaram com certa suntuosidade boa parte do repertório inteiramente autoral do disco Portas, um azeitado trio de sopros – formado por Antonio Neves (trombone e arranjos), Eduardo Santanna (trompete e flugelhorn) e Lessa (flauta e saxofone), músicos também presentes no álbum – bafejou grande parte das 32 músicas do roteiro quase totalmente autoral, garantindo frescor até a hits batidos como Velha infância (Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Pedro Baby e Davi Moraes, 2002).
Marisa Monte canta o samba-enredo da escola Império Serrano no show ‘Portas’
Leo Aversa / Divulgação
Marcantes ao longo do show, os metais garantiram a pulsação quente do samba-rock Você não liga (Marisa Monte e Marcelo Camelo, 2021) e, de certa forma, encobriram as presenças na banda de músicos excepcionais como o baterista Pupillo e Davi Moraes, guitarrista que ficou sob o holofote na execução de Eu sei (Marisa Monte, 1991) sem se destacar na banda.
Já Chico Brown – com quem Marisa abriu e firmou parceria no álbum Portas – sobressaiu ao se revezar entre teclados, guitarra, baixo e voz, bancando o guitar hero em Déjà vu (Marisa Monte e Chico Brown, 2021), pontuando no piano a latinidade de Seo Zé (Marisa Monte, Carlinhos Brown e Nando Reis, 1994) e se revelando legítimo herdeiro do pai, Carlinhos Brown, percussionista de musicalidade exuberante.
Ausente na criação do repertório do álbum Portas, Carlinhos Brown esteve presente no show como compositor de bem-vindas músicas antigas como Maria de verdade (1994) e Magamalabares (1996), fecho perfeito – antes do bis – para espetáculo de atmosfera onírica que fluiu como serenata moderna e vibrante, com o canto da sereia semeando paz.
Citando a letra de Brown, o séquito da cantora ouviu sininhos desde a abertura climática do show com a canção Pelo tempo que durar (2006), parceria de Marisa com a contemporânea Adriana Calcanhotto, colega de geração. Foi quando o palco abriu as portas da percepção com atmosfera visual que atingiu picos de encantamento com as imagens projetadas ao longo da música-título Portas (2021), canção de Marisa com Arnaldo Antunes e Dadi Carvalho, multi-instrumentista que representou porto seguro para a banda e a cantora nos toques do baixo, da guitarra e dos teclados.
Talvez por se reconhecer instrumentista meramente eficiente no toque do violão, da guitarra e do ukulele, uma artista cuja musicalidade pulsa em cena mais nas composições e no canto afinado e preciso, Marisa Monte sempre se cercou de grandes músicos como os que a rodeiam no show Portas.
Houve espaços e louvações para todos na estreia de Portas, mas quem imperou no centro do palco, absoluta, com figurinos que foram mudando ao longo da apresentação, foi a própria Marisa, arquiteta e diretora geral desse show que teve significado especial por marcar o reencontro da artista com o público em era pandêmica.
“Quanto tempo, né?”, sublinhou a cantora após cantar Quanto tempo (Marisa Monte e Chico Brown, 2021), uma das 11 músicas do repertório do disco Portas incluídas no roteiro do show – ao todo, são 17 músicas, se contabilizada a canção em português e espanhol Vento sardo (2021), lançada como single avulso em outubro após o álbum (há uma 18ª música na safra autoral do disco, Feliz e forte, ainda inédita).
Marisa Monte toca guitarra no show ‘Portas’
Leo Aversa / Divulgação
Composta e gravada por Marisa com Jorge Drexler, Vento sardo espalhou beleza – com a voz e a imagem do cantor espanhol no telão e com Marisa simulando no figurino a saia rodada de Oyá citada na letra – em show pautado por costuras sutis do roteiro bem alinhavado com hits inevitáveis como Já sei namorar (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 1991), pop aditivado ao fim com o toque heavy de guitarras.
Ouvintes atentos perceberam que o reduto de paz retratado em Vilarejo (Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Pedro Baby, 2006) se afinou com a atmosfera de encantamento da música seguinte, A língua dos animais (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Dadi Carvalho, 2021).
Da mesma forma, a alma soul da canção Ainda lembro (Marisa Monte e Nando Reis, 1991) – música há muito ausente dos shows de Marisa e incluída no show Portas a pedido dos fãs em enquete online – preparou o clima para a lembrança de um sucesso de Tim Maia (1942 – 1998), O que me importa (Cury, 1972), revivido por Marisa no álbum Memórias, crônicas e declarações de amor – Textos, provas e desmentidos (2000).
Entre músicas do disco Portas, como a envolvente Praia vermelha (Marisa Monte e Nando Reis, 2021), também reapareceram músicas abordadas pela cantora no primeiro álbum, MM (1989), gravado ao vivo. Uma delas foi Preciso me encontrar (Candeia, 1976), samba de atmosfera melancólica acentuada pelo sopro climático do trombone de Antônio Neves, ouvido entre o choro da cuíca de Pretinho da Serrinha.
Outra pérola pescada por Marisa do repertório do show de 1988 foi o samba-enredo Lendas das sereias, rainhas do mar (Vicente Mattos, Dinoel Sampaio e Arlindo Velloso, 1975), com o qual a escola Império Serrano desfilou no Carnaval de 1976. O canto da sereia fez o link com o samba de exaltação da Portela Elegante amanhecer (2021), parceria de Marisa com o imperial Pretinho da Serrinha, percussionista que evoluiu com Marisa pelo palco no passo desse samba de cepa nobre.
No bis, Marisa serviu Comida (Arnaldo Antunes, Marcelo Frommer e Sergio Britto, 1987), rock que deu o toque político de show que, se desviando das tensões do Brasil de 2022, ofereceu momentos de paz e otimismo, explicitado em Pra melhorar (Marisa Monte, Seu Jorge e Flor, 2021), tema contagiante, estrategicamente alocado após a música dos Titãs.
Marisa Monte à frente da banda na ‘caixa cênica’ do show ‘Portas’
Leo Aversa / Divulgação
Fiel à determinação de espalhar boas vibrações, Marisa Monte jogou o tempo todo para a galera anestesiada que ocupou as cadeiras do Espaço das Américas. “Mais uma para esse coralzão”, anunciou a cantora, antes de sapecar Beija eu (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Arto Lindsay, 1991) e após apresentar Ainda bem (Marisa Monte e Arnaldo Antunes, 2011) com evocações do som mariachi e da música flamenca. Perto do fim, Não vá embora (Marisa Monte e Arnaldo Antunes, 2000) foi outro aceno para o coralzão.
Na seara das canções românticas, a apaixonada balada Totalmente seu (Marisa Monte, Lucio Silva e Lucas Silva, 2021) se confirmou como possível futuro hit do álbum Portas enquanto Depois (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 2011) reiterou o dom de Marisa para fazer aliciantes canções com os parceiros tribalistas, também coautores de Infinito particular (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 2006).
Aliado ao canto da sereia, cujos gorjeios pavimentaram Na estrada (Marisa Monte, Carlinhos Brown e Nando Reis, 1994), o talento da compositora – dona de obra autoral construída a partir do segundo álbum, Mais (1991) – garantiu que o show Portas se abrisse para a total satisfação do público.
Para o séquito de Marisa Monte, nem o caráter dèjá vu do efetivo final do show – arrematado em um segundo bis com o canto a capella de Bem que se quis (E po’ che fà – Pino Danielle, 1982, em versão em português de Nelson Motta, 1989) em número encerrado somente com o coro do público, com a cantora já fora de cena – empanou o brilho de fato arrebatador do show Portas.
Para o séquito, Marisa Monte reiterou na estreia de Portas a soberania em mar de canções, sons e imagens fascinantes.
Marisa Monte alinha 32 músicas no roteiro do show ‘Portas’
Leo Aversa / Divulgação
♪ Eis as 32 músicas do roteiro seguido por Marisa Monte em 4 de fevereiro de 2022 na estreia da turnê internacional do show Portas no Espaço das Américas, na cidade de São Paulo (SP):
1. Intro – Pelo tempo que durar (Marisa Monte e Adriana Calcanhotto, 2006)
2. Portas (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Dadi Carvalho, 2021)
3. Quanto tempo (Marisa Monte e Chico Brown, 2021)
4. Maria de verdade (Carlinhos Brown, 1994)
5. Vilarejo (Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown e Pedro Baby, 2006)
6. A língua dos animais (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Dadi Carvalho, 2021)
7. Infinito particular (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 2006)
8. Praia vermelha (Marisa Monte e Nando Reis, 2021)
9. Ainda bem (Marisa Monte e Arnaldo Antunes, 2011)
10. Beija eu (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Arto Lindsay, 1991)
11. Totalmente seu (Marisa Monte, Lucio Silva e Lucas Silva, 2021)
12. Ainda lembro (Marisa Monte e Nando Reis, 1991)
13. O que me importa (Cury, 1972)
14. Preciso me encontrar (Candeia, 1976)
15. Vento sardo (Marisa Monte e Jorge Drexler, 2021)
16. A sua (Marisa Monte, 2001)
17. Déjà vu (Marisa Monte e Chico Brown, 2021)
18. Depois (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 2011)
19. Calma (Marisa Monte e Chico Brown, 2021)
20. Eu sei (Marisa Monte, 1991)
21. Velha infância (Marisa Monte, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Pedro Baby e Davi Moraes, 2002)
22. Seo Zé (Marisa Monte, Carlinhos Brown e Nando Reis, 1994)
23. Elegante amanhecer (Marisa Monte e Pretinho da Serrinha, 2021)
24. Lenda das sereias, rainhas do mar (Vicente Mattos, Dinoel Sampaio e Arlindo Velloso, 1975) – Samba-enredo da escola Império Serrano no Carnaval de 1976
25. Você não liga (Marisa Monte e Marcelo Camelo, 2021)
26. Na estrada (Marisa Monte, Carlinhos Brown e Nando Reis, 1994)
27. Não vá embora (Marisa Monte e Arnaldo Antunes, 2000)
28. Magamabalares (Carlinhos Brown, 1996)
Bis:
29. Comida (Arnaldo Antunes, Marcelo Frommer e Sergio Britto, 1987)
30. Pra melhorar (Marisa Monte, Seu Jorge e Flor, 2021)
31. Já sei namorar (Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, 1991)
Bis 2:
32. Bem que se quis (E po’ che fà – Pino Danielle, 1982, em versão em português de Nelson Motta, 1989)
♪ O crítico e colunista Mauro Ferreira viajou a São Paulo (SP) a convite da produção de Marisa Monte.
Marisa Monte no show ‘Portas’
Leo Aversa / Divulgação

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