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Tarsilinha: a dor e a delícia de ser a sobrinha da musa do modernismo

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Sobrinha da artista de quem carrega o nome famoso, ela chegou a conviver com a tia, mas descobriu detalhes da vida dos Modernistas só depois que começou a estudar as histórias e os documentos que herdou depois da morte da pintora. Tarsilinha: a dor e a delícia de ser a sobrinha da musa do modernismo
Tarsilinha, a sobrinha da artista de quem carrega o nome famoso, chegou a conviver com a tia, mas descobriu detalhes da vida dos Modernistas só depois que começou a estudar as histórias e os documentos que herdou depois da morte da pintora. Veja na entrevista no vídeo acima.
Tarsila do Amaral, a Tarsilinha, mora em uma fazenda da família no interior de São Paulo, mas guarda no seu apartamento na capital paulistana, obras, pincéis e lembranças da tia modernista. Ela revelou as histórias amorosas da pintora, contou como a artista inspirou Oswald de Andrade e admitiu que a artista serviu de inspiração para as mulheres cem anos atrás e ainda é um ícone importante neste tema. Veja a entrevista no vídeo acima.
Esta entrevista para a GloboNews é a primeira de uma série de conversas publicadas pelo g1 com os herdeiros de artistas da Semana de Arte Moderna, que completa 100 anos.
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A pintora era a filha mais velha de sete irmãos. Ela nasceu em 1º de setembro de 1906, em Capivari, interior de São Paulo, em uma das muitas fazendas do pai. De família rica, foi educada à moda francesa da época: tinha que aprender a ler e escrever muito bem em português, falar francês e bordar. Estudou no colégio Sion, na capital paulista, e terminou os estudos em Barcelona. Foi lá que teve os primeiros contatos com a pintura, mas, retornando ao Brasil, casou-se com o médico André Teixeira Pinto, primo da mãe dela. Eles tiveram uma filha. No casamento, percebeu que teria que abdicar do sonho de ser artista.
“Ela começou a se incomodar, tinha uma diferença muito grande cultural entre ela e o marido. O marido a estava traindo, ela estava muito triste e quis se separar”, revela a herdeira da artista.
A separação foi contra todos os costumes da época. O pai de Tarsila, José Estanislau do Amaral Filho, foi quem deu o apoio moral e financeiro para a que a filha saísse do casamento e, também, abraçasse a carreira que tanto queria seguir: a de pintora.
Em 1917, ela começou a aprender pintura com Pedro Alexandrino Borges e, no ateliê, conheceu Anita Malfatti. Anita já havia feito a famosa exposição que deixou furioso o crítico de arte Monteiro Lobato. Ele chegou a escrever no jornal Estadão que as 53 pinturas expostas por Malfatti eram arte anormal, paranoica e mistificada.
Anita era vanguarda demais para a tradicional sociedade paulistana do início do século 20. A reação da crítica serviu de inspiração para Tarsila.
“Em 1920, a minha tia vai pra Paris, e ela fica se correspondendo com a Anita. Então, fica sabendo sobre o movimento, sobre as pessoas que estavam envolvidas e, também, sobre a Semana de Arte Moderna através das cartas da Anita”, conta a sobrinha-neta de Tarsila.
Apesar de ser sempre citada, Tarsila não participou do evento no Theatro Municipal, em fevereiro de 1922. Ela retornou de Paris em junho daquele ano. E ao encontrar os modernistas numa reunião em uma confeitaria no centro de São Paulo, caiu de amores pelo movimento, e Oswald de Andrade, por ela.
“Quando ela chega, que ela se integra, tem o Grupo dos Cinco. Eles formam o Grupo dos Cinco: a Tarsila entra, o Mário de Andrade, Oswald de Andrade – que não eram parentes – e o Menotti Del Picchia. E foi um grupo que agitou, assim, São Paulo culturalmente”, conta Tarsilinha.
Em 1923, ela e Oswald, já namorados, viajaram pela Europa, estudaram em Paris e entraram em contato com o cubismo.
Quando retornaram ao Brasil, em 1924, Tarsila e Oswaldo se jogam em uma aventura “antropológica” pelo país com o poeta franco-suíço Blaise Cendrars. Eles conheceram o carnaval e as favelas cariocas e viajaram pelo interior de Minas Gerais, trazendo na bagagem cores, ritmos e histórias, que dariam início ao movimento Pau-Brasil.
Mas dois anos depois, um presente de aniversário de Tarsila do Amaral para o marido Oswald de Andrade mudaria o rumo do Modernismo.
“Para mim, o Abaporu é um autorretrato. Para mim, ela estava pensando no que fazer pra dar de presente pra Oswald de Andrade.”
“Ela estava com as pernas dobradas, com a mão apoiada na perna e a mão apoiada na cabeça, em frente a um espelho. Quando se olhou nessa perspectiva, esse espelho inclinado, ela viu o pé dela grande e a cabeça dela pequena, exatamente na proporção do Abaporu”, conta a sobrinha-neta de Tarsila.
Abaporu, que em tupi-guarani significa homem que come homem, foi o estopim da Antropofagia, movimento de 1926. Oswald e os modernistas propuseram um resgate das artes originais do Brasil, das cores, dos sons, dos temas que não tinham sofrido influência da arte europeia. A ideia era “engolir” as influências estrangeiras e “regurgitar” uma arte originalmente brasileira.
Em 1929, outra grande decepção amorosa. A maior de todas, talvez. Tarsila descobriu que Oswald estava tendo um affair com Patrícia Gomes Galvão, a revolucionária Pagu.
“Minha tia coloca a Pagu dentro de casa, e o que aconteceu? Pagu começou a ter um caso com Oswald de Andrade. Pagu engravida de Oswald de Andrade”, conta a herdeira.
Tarsila encontra o próximo companheiro quando se filia ao Partido Comunista Brasileiro em 1931: o psiquiatra Osório César. Os dois viajam para várias cidades da então União Soviética e de outros países do leste europeu. Quando pisa novamente no Brasil, em 1933, a pintora é presa pelo regime de Getúlio Vargas e acaba sendo enquadrada como inimiga do Estado.
“Mas o fruto dessa história, é o ‘Operários’, né? Ela retrata realmente os trabalhadores do Brasil, mas também vai retratar a diversidade étnica, a diversidade cultural e até a diversidade religiosa”, analisa a sobrinha-neta de Tarsila.
Depois da prisão, Tarsila termina a relação com Osório e volta a pintar em estilos das fases anteriores.
Em 1933, em um evento em homenagem a Le Corbusier, um dos ícones da arquitetura modernista mundial, a artista encontrou o último companheiro de arte e de vida: Luís Martins, com quem ficou casada por 18 anos.
“O detalhe é que ele era 21 anos mais novo do que ela. Nessa época, minha tia tinha 47 anos e o Luiz tinha 26. Realmente, precisava ser mulher muito à frente do seu tempo para encarar essa diferença de idade, encarar, enfim, esse novo amor e precisava ser uma pessoa com muita força mesmo para encarar todos os desafios que iam acontecer”, diz Tarsilinha.
Tarsila rompe com Luis quem decide se separar de Luís porque achava que ele deveria ter filhos e não seria com ela que realizaria este sonho. Em 1965, já sozinha, ficou paralítica depois de um erro médico em uma cirurgia de coluna. Seus últimos anos, não foram fáceis.
Tarsila do Amaral, a artista-símbolo do modernismo brasileiro, morreu em São Paulo, em 17 de janeiro de 1973.
“A questão da mulher, nossa, a minha tia realmente é uma inspiração mesmo para as mulheres de hoje, né? A vida que ela teve, a obra que ela criou. É uma grande inspiração. E eu acho que também que a obra dela, com essa brasilidade, também é fonte de inspiração para os artistas de hoje”, conclui a herdeira de Tarsila do Amaral.

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