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Festas e Rodeios

‘Abri mão de carreira no auge para viver minha verdade’, diz mulher trans que foi cantora gospel

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Jotta A falou abertamente sobre a transição de gênero semanas atrás, por meio de publicação no Instagram. Nas redes, recebeu diversas mensagens de carinho, mas também foi alvo de inúmeras ofensas. Jotta A, de 24 anos, vive fase de descobertas após abandonar carreira gospel
Arquivo Pessoal via BBC
Jotta A vivia o auge da carreira musical no meio gospel. Acumulava milhões de visualizações em seus vídeos em diversos países, tinha fã-clubes, já havia recebido indicação ao Grammy Latino e era sensação em eventos evangélicos.
Um fenômeno que ecoava em rádios do Brasil e de outros países latino-americanos, por suas diversas músicas gravadas em espanhol. Era a história de superação da criança que nasceu no município de Guajará Mirim, em Rondônia, enfrentou dificuldades ao se mudar para São Paulo em busca do sonho de viver da música e alcançou o sucesso.
Mas isso não era sinônimo de felicidade para ela. Em meio à pandemia de covid-19, com shows adiados e sem perspectiva sobre a retomada da rotina, passou uma fase que define como de “muita solitude”, olhou para si e decidiu que não queria mais viver daquela forma.
“Precisei ficar a sós comigo mesma para provar a roupa que eu queria ou poder colocar o vestido que eu queria”, diz à BBC News Brasil.
Nesse período, decidiu que precisava se conhecer melhor. O primeiro passo foi abandonar a música gospel, ela conta.
“Tive que abrir mão de uma estabilidade, de uma carreira construída, para viver a minha verdade. Digo abrir mão porque viver a verdade ainda é um tabu muito grande. Para que eu pudesse buscar o autoconhecimento, tive, de certa forma, que abrir mão de toda a comodidade que uma carreira brilhante me trouxe”, diz.
Dois anos depois, iniciou o processo para alterar os documentos para o gênero feminino. O nome que no passado era artístico fará parte de seus registros oficiais: Jotta.
Artista começou a cantar ainda na infância e talento musical logo chamou a atenção
Arquivo Pessoal via BBC
Carreira musical
O passado e o presente de Jotta são conectados principalmente pela atividade que ela considera que a mantém viva: a música.
A carreira musical dela começou na igreja evangélica, quando ainda era muito nova. “A igreja é um local de muita musicalidade, eu ouvia muita música e isso despertou um desejo muito grande. Meus pais viram que talvez eu tivesse talento e me incentivaram muito”, relembra.
Na infância, costumava ouvir e cantar música gospel – e o talento chamava a atenção. Aos seis anos, gravou o primeiro CD. Quando a família se mudou para São Paulo, Jotta se inscreveu no programa de calouros do apresentador Raul Gil. Ela, que estava no início da adolescência, venceu a disputa e se tornou conhecida nacionalmente.
“Depois disso, recebi inúmeros convites para gravar CD em inglês ou em espanhol e nunca mais parei”, diz.
Em 2014, o seu segundo álbum foi indicado ao Grammy Latino na categoria de música cristã em língua portuguesa. Naquele ano, o prêmio foi vencido pela cantora brasileira Aline Barros.
Ao longo da carreira gospel, Jotta foi responsável por inúmeras músicas de sucesso em português e espanhol. No YouTube, os vídeos antigos da artista acumulam milhões de visualizações – um deles com mais de 76 milhões.
“Vivi muitos momentos que posso dizer que foram especiais na minha carreira, momentos de muito status em que cheguei a lugares altos que eu nunca imaginei. Eu sou uma pessoa nortista, de uma família que não tinha uma condição financeira boa e conquistei várias coisas incríveis”, avalia a artista.
E foi justamente no auge da carreira, com possibilidade de crescer ainda mais, que Jotta A decidiu mudar a própria história.
“Eu percebi que precisava fazer por mim mesma, não fazer pela minha carreira, não fazer por todos aqueles prêmios que eu poderia conquistar pela minha música, mas por mim mesma. Então foi o momento em que entendi que, de fato, precisava me autoconhecer”, comenta.
Imagem mostra momento em que Jotta A se preparava para ir ao cartório para iniciar processo de mudanças em documentos
Arquivo Pessoal via BBC
Enquanto o mundo enfrentava a dura batalha contra a covid-19, Jotta A usou o período de isolamento social para viver uma fase de busca por respostas sobre o próprio futuro.
“A pandemia foi um momento difícil para muitas pessoas e perdi pessoas importantes na minha vida. Mas também foi um momento em que eu tinha uma agenda lotada, cancelaram tudo e eu não sabia o que fazer. Eu precisava me libertar. Foi quando falei: ‘puxa, talvez esse seja também um momento de solitude no qual posso decidir de vez o que fazer'”, diz.
A Jotta
Hoje, aos 24 anos, a artista avalia que sempre se enxergou como uma mulher transgênero. “Com certeza desde criança sempre me entendi como uma mulher, mas nunca tive oportunidade de exteriorizar tudo isso”, reflete.
Ela desconhecia a realidade de mulheres trans e só teve o primeiro contato com uma quando tinha cerca de 16 anos. “Até então, tudo o que eu tinha à vista era a experiência cisgênero (pessoas que se reconhecem com o gênero que nasceram), então pensava que nunca seria uma mulher porque nunca teria um útero ou uma vagina. Esse meu primeiro contato com uma mulher trans me fez ver que eu não preciso ser uma mulher cisgênero para ser uma mulher na sociedade. Então, ali me senti representada”, conta.
Mas Jotta diz que ainda tinha muitos receios. “Eu nunca pude expressar o meu gênero. Para mim, sempre foi uma coisa que tive que privar das pessoas porque tinha medo do que poderia acontecer. Infelizmente, o preconceito deixa a gente acanhada para desbravar esse mundo de autoconhecimento.”
Quando iniciou a transição de gênero, a cantora decidiu falar sobre o assunto aos poucos por medo da exposição. O principal temor era como o público religioso e conservador encararia o fato de ela ser uma mulher trans.
“Primeiro eu falei para as pessoas que eu era uma pessoa não-binária (que não se identifica no gênero masculino ou feminino). Foi uma maneira que considero que pode ser mais leve. Foi o primeiro passo. E só agora, há alguns dias, estou podendo falar para as pessoas quem eu sou de verdade”, diz.
Foi em 11 de abril que Jotta revelou ser uma mulher transgênero, por meio de uma publicação no Instagram na qual aparece em uma rua de São Paulo com um visual diferente do habitual: tranças na altura do ombro, roupas femininas, um salto alto e uma bolsa no ombro.
“Essa sou eu indo ao cartório para fazer a primeira solicitação de retificação do meu nome de registro”, escreveu no início do post.
Na publicação, explicou que escolheu manter o nome artístico por “ser uma maneira de estar atrelada sempre” à própria história. “Recomeçar não é fácil, mas estou feliz, por estar vivendo todo esse processo. Feliz em ter tantas pessoas que me apoiam e acreditam em mim nessa nova etapa”, concluiu no texto na rede social.
E ali começou publicamente a vida da Jotta, que passou a compartilhar inúmeras fotos do seu cotidiano.
“Depois do momento de solitude tão especial, que começou dois anos atrás, agora estou podendo externar tudo isso e está sendo incrível”, diz a cantora à BBC News Brasil.
Nesses últimos anos, ela fez terapia, mudou o próprio visual algumas vezes e recentemente deu início à terapia hormonal.
O procedimento para mudar os documentos ainda está em andamento. “Fiz a petição no cartório de São Paulo, mas antes tive que receber minha certidão (de nascimento) que veio de Rondônia”, explica sobre o processo, que ainda não tem prazo para conclusão.
Jotta A pretende lançar álbum de música pop em breve
Arquivo Pessoal via BBC
Os ataques nas redes sociais
As recentes publicações de Jotta A nas redes sociais geraram uma onda de carinho, mas ela também foi alvo de incontáveis ofensas e comentários preconceituosos. Muitos deles partem de pessoas que afirmam que ela se perdeu de Deus e precisa retornar à religião.
“Nós vivemos em um mundo onde as maiores religiões são catequistas. O que isso significa? Uma religião catequista que tem um intuito missionário, ela tenta te convencer a acreditar em um Deus verdadeiro e normalmente esse Deus verdadeiro é o dela. E eu sempre, lendo a bíblia, vi que Cristo não era um ser humano catequista. Ele nunca quis forçar ninguém a nada, mas a mensagem dele convencia porque era uma mensagem de amor e atraía todas as pessoas”, diz Jotta.
“O que eu sinto hoje de mais difícil é a falta de sensibilidade das pessoas de entenderem que cada um vive o seu mundo. E muitas pessoas que me acompanham desde criança às vezes tentam me forçar a uma realidade que não é a minha. Isso acaba conflitando em muitos assuntos pessoais que todos nós temos, como, por exemplo, assuntos de fé ou assuntos sociais. Eu acho que vamos viver em uma comunidade com mais empatia quando entendermos que vivemos em uma sociedade e devemos socializar, mas que temos vidas diferentes”, acrescenta.
Atualmente, ela não tem religião, mas diz respeitar todas. “A minha família toda é da igreja, então de certa forma ainda é o meu convívio. A minha avó sempre ora por mim quando a vejo e eu recebo isso com muito apreço, com muito carinho. Mas eu acho que posso viver a fé hoje sem nenhum vínculo religioso. Eu posso viver de uma maneira mais natural”, afirma.
Entre os familiares, Jotta diz que tem tido paciência para entender que a compreensão sobre a transexualidade é “um processo que leva tempo”, porque “não é algo somente pessoal, ela acaba atingindo as pessoas ao seu redor”.
“Hoje eu tenho uma afinidade e um carinho, uma empatia muito grande pelos meus pais, apesar de não termos concordância em alguns assuntos”, pontua. O principal apoio familiar nesse período, diz, é o da irmã. “Os meus sobrinhos me chamam de tia desde o momento em que eu falei para eles. Para mim esses mínimos detalhes já são um grande salto”, conta.
‘Um momento libertador’
Jotta, que morava no Rio de Janeiro, recentemente se mudou para São Paulo para focar na nova fase da carreira. Agora, ela canta pop e nos próximos dias irá lançar uma nova música.
“Eu acho que esse momento tem sido muito libertador também artisticamente. Estou podendo escrever o que quero e em um período próximo vou lançar um álbum que vai contar sobre toda essa minha transição. Acho que vai ser legal para o público também entender artisticamente o que estou vivendo”, diz.
Em um país em que a violência afeta duramente a população LGBTQIA+, Jotta A quer ser referência no cenário cultural e mostrar que é possível ser feliz sem precisar se esconder.
“Eu quero que as pessoas, de alguma forma, sejam valorizadas através das suas próprias histórias e que elas se identifiquem com a minha verdade”, afirma.

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The Cure lança ‘Alone’, primeira música nova em 16 anos

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Canção melancólica com quase sete minutos é a 1ª faixa de ‘Songs of a Lost World’, o 14º álbum de estúdio do grupo britânico, que será lançado em 1º de novembro. Ouça a música. Robert Smith, líder do The Cure, canta em São Paulo, em 2013
Flávio Moraes/G1
A banda britânica The Cure lançou sua primeira música nova em 16 anos nesta quinta-feira, o single “Alone”, e confirmou que seu aguardado álbum sairá em 1º de novembro.
A canção melancólica com quase sete minutos de duração é a primeira faixa de “Songs of a Lost World”, o 14º álbum de estúdio do The Cure. O último deles, “4:13 Dream”, foi lançado em 2008.
A banda apresentou músicas do novo álbum durante a turnê “Shows Of A Lost World”, abrindo os shows com “Alone”.
“É a faixa que destravou o disco; assim que gravamos essa música, eu sabia que era a música de abertura e senti o álbum inteiro entrar em foco”, disse o vocalista Robert Smith, em um comunicado.
“Eu vinha sofrendo para encontrar a frase de abertura certa para a música de abertura certa há algum tempo, trabalhando com a simples ideia de ‘estar sozinho’, sempre com a sensação incômoda de que eu já sabia qual deveria ser a frase de abertura.”
Smith acrescentou que se lembrou do poema “Dregs”, de Ernest Dowson, ao terminar a gravação “e foi nesse momento que eu soube que a música — e o álbum — eram reais”.
O início de “Alone” tem um instrumental de mais de três minutos antes de Smith começar a cantar: “Esse é o fim de todas as músicas que cantamos / O fogo se transformou em cinzas e as estrelas escureceram com as lágrimas”.
Ele continua cantando sobre “pássaros caindo de nossos céus”, “amor caindo de nossas vidas” e um “lamento de voz quebrada para nos chamar para casa”.
A publicação musical britânica “NME” chamou a música de “épica e emocional” e o jornal “Guardian” a descreveu como “majestosamente envolta em sofrimento e desespero”, dando-lhe quatro em um máximo de cinco estrelas.
The Cure, que fez sua estreia no final da década de 1970 e é conhecido por seu pós-punk e faixas melancólicas mais sombrias, há muito tempo vinha ensaiando lançar um novo álbum, com Smith revelando o título do disco “Songs of a Lost World” em 2022.

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Maggie Smith morre aos 89 anos; veja FOTOS da carreira da atriz

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Atriz de “Harry Potter” e “Downton Abbey” morreu ‘pacificamente no hospital’ e a causa não foi informada. Ela ganhou dois Oscars, quatro Emmys, três Globos de Ouro, um Tony e sete Baftas. Maggie Smith
AP Photo/Kirsty Wigglesworth, File
Maggie Smith com Rupert Grint durante o tapete vermelho do lançamento de “Harry Potter e o Enigma do Príncipe”
REUTERS/Luke MacGregor/Arquivo
Maggie Smith com Penelope Wilton em “Downton Abbey II: Uma Nova Era”
Divulgação
Maggie Smith e Michelle Dockery em ‘Downton Abbey’
Divulgação
Maggie Smith nos bastidores de ‘Hot Millions’, de 1968
AP Photo/Bob Dear, File
Maggie Smith ganhou o Oscar na categoria melhor atriz coadjuvante por “California Suite”, em 1979
AP Photo/Reed Saxon, File
Maggie Smith em “Harry Potter e a Pedra Filosofal”
Divulgação
Maggie Smith recebe o BAFTA por sua atuação em ‘Tea with Mussolini’, em 2000
Reuters/File Photo
Maggie Smith durante a premiere de ‘O Exótico Hotel Marigold 2’, em Londres, em 2015.
REUTERS/Peter Nicholls/File Photo
Maggie Smith no lançamento do filme “O quarteto” no Festival de Cinema de Londres, em 2012
ANDREW COWIE / AFP
Maggie Smith com Dustin Hoffman no lançamento do filme “O quarteto” no Festival de Cinema de Londres, em 2012
ANDREW COWIE / AFP

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Pit Passarell, baixista e fundador da Viper, também reinou nos anos 1990 como cantor da banda de heavy metal

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Morto hoje, aos 56 anos, artista foi o vocalista de álbuns do grupo como ‘Evolution’ e ‘Coma rage’. ♫ OBITUÁRIO
♪ Na certidão de nascimento, expedida em Buenos Aires, constava o nome de Pedro Sérgio Murad Passarell (11 de abril de 1968 – 27 de setembro de 2024). Mas é como Pit Passarell que o baixista, cantor e compositor argentino fica imortalizado na cena brasileira de heavy metal.
Baixista e vocalista da banda paulistana Viper, Pit Passarell morreu na madrugada desta sexta-feira, aos 56 anos, em decorrência de câncer no pâncreas. A morte foi anunciada hoje no perfil oficial do grupo paulistano no Instagram. Pit estava internado em hospital de São Paulo (SP), cidade onde o corpo do artista será velado e enterrado no início da tarde.
Um dos fundadores da banda Viper, surgida em 1985, Pit acumulou as funções de baixista e vocalista quando o cantor André Mattos (1971 – 2019) deixou o grupo em 1990. Álbuns como Evolution (1992), Coma rage (1995) e Tem pra todo mundo (1996) foram gravados em estúdio pela Viper com Pit Passarell como baixista e vocalista principal da banda.
Como vocalista, o reinado do artista foi de 1991 a 2004. Já o posto de baixista foi de Pit Passarell da criação da banda até a precoce saída de cena nesta sexta-feira, 27 de setembro.
Irmão de Yves Passarell, guitarrista da banda Capital Inicial, Pit compôs e pôs voz em músicas como Coma rage (1995), Blast! (1995) e Somebody told me you’re dead (1995).
Como solista, o artista lançou somente um álbum, Praticamente nada, editado em 2000, mas gravado muito antes, entre 2008 e 2009.

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