Vocais da música são abafados porque MCs não tinham nem microfone ao gravarem. Mesmo assim, funk chegou até Luisa Sonza, que deu toque de ‘desapego feminino’, e virou hit nº1 no Brasil. DJ Frog, Luisa Sonza, Gabriel do Borel e Davi Kneip em ‘SentaDONA’
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Uma tarde tomando uísque, uma sessão de gravação improvisada, a batida da “jogadinha do TikTok” e uma letra que começou com três homens contando vantagem e terminou com um mulher por cima no remix. Essa é a história intensa de “SentaDONA”, música nº1 no Brasil hoje.
Luisa Sonza é o nome mais conhecido, mas a faixa deu voltas antes que ela pudesse sentar. A base saiu da cabeça do MC Frog – o cantor e produtor mineiro Thiago André Virgínio Vieira, 25 anos. As vozes originais são dele, do conterrâneo influencer Davi Kneip e do carioca Gabriel do Borel.
Davi queria trabalhar com Frog, referência do funk de BH. Ele o chamou para passar uma tarde em sua casa na piscina tomando uísque. Com Frog capturado, Davi insistiu para fazerem uma música. Ali começou a história do hit. Confira:
Frog diz que, apesar dos ricos agrados, a casa não tinha nenhum equipamento – nem microfone para gravar, apenas “um fone de ouvido com um lado só funcionando” e um computador.
Eles cantaram direto no celular mesmo – por isso as vozes são abafadas. Frog fez os versos iniciais e Davi lembrou que Gabriel do Borel estava em BH para fazer um show.
Eles ligaram para Gabriel, que até topou a parceria, mas não dava para sair do hotel. Ele mandou os versos por WhatsApp – incluindo o trecho “ai, calica”, gíria carioca que denota empolgação.
Frog pegou o computador, instalou um programa de edição e terminou a faixa na hora. A base foi o “beat da jogadinha”, tipo de batida com vocais recortados que é moda nas dancinhas.
Frog achou ruim aquela gravação improvisada, mas em 2 dias “Sentadona” viralizou. Luisa ouviu no perfil de Gabriel do Borel e pediu para entrar na parceria, que virou o remix “SentaDONA”.
Com ajuda de Gabriel, Luisa incluiu trecho de trap e fez uma reviravolta na letra: em vez do homem desapegado, agora é Luisa que “senta sem sentimento” (a “DONA” do título).
O remix finalizado por Gabriel impulsionou ainda mais o refrão que já estava pegando no TikTok e no Instagram, e “SentaDONA” chegou ao nº1 na parada nacional do Spotify.
“Na primeira vez que eu escutei a música, falei: ”Quero! Essa música é muito f#d@. Não só porque saberia que seria um sucesso, mas porque senti que eu cabia ali'”, diz Luisa Sonza.
“Desde 2019, a gente pensa em lançar alguma coisa junto”, comenta Luisa. “Falei para o Gabriel: ‘Acredito que possa ser número 1′”. O faro apurado de Luisa Sonza para o sucesso estava certo de novo.
“O Gabriel topou na hora, no outro dia veio para o estúdio aqui em São Paulo, e no mesmo dia a gente já fez o remix. Em cinco dias a gente fez o clipe, fui viajar para o México, voltei e no outro dia já lançamos a música”, lembra a cantora.
MC Frog, Luisa Sonza e Davi Kneip em ‘SentaDONA’
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Resposta aceita
MC Frog acompanhou a produção do remix por videochamada. Ele entendeu a reviravolta à distância – e não se ofendeu. “Eu fiz a letra pensando no que um cara faria, falaria. Quando ela deu a resposta, falei: ‘Ca**lho, f*da! O funk é cada vez mais feminino e as mulheres estão carregando muito o funk”.
No original, os 3 homens se gabam de fazer uma mulher que dizia ter o “coração gelado” se apaixonar após dar uma “sentadona” neles. No remix, Luisa dá o troco e diz que chamou “outros 20” de namorados: “Onde eu quico / Onde eu sento/ Eles me pedem em casamento”, ela canta.
“Ela me fez pensar. Agora quando canto essa música no show, eu falo: ‘Você conhece um cara que já mentiu para você?”, conta Frog.
Luisa Sonza passou o rodo
O MC mineiro se impressionou com o empenho de Luisa na gravação do clipe. “Ela era braba, direcionava tudo. A gente marcou para gravar na casa dela de dia, mas choveu. Em vez de mandar alguém, ela foi, de maquiagem e cabelo feito, passar o rodo na quadra”.
(“Passar o rodo”, neste caso, não era um trecho da letra com a disputa de sedução, mas o trabalho de secar o cenário para o clipe.)
Capa do single ‘Sentadona remix’, com Luísa Sonza
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Filho do funk
Desembolar um funk só com um celular na mão e um uísque na cabeça é uma habilidade que corre no sangue do MC Frog.
Não é clichê dizer que o Frog é filho do funk de BH. Os pais dele se conheceram no Baile do Vilarinho, evento histórico para o estilo na cidade. Eliseu era DJ e Liliane dava aula de dança “estilo Miami” na quadra do Vilarinho.
O universo de origem do Frog, aliás, está registrado no recente álbum “Baile”, de FBC e Vhoor, inspirado na era do Miami Bass na cidade. Mas o filho acabou envolvido com a nova geração do viajante funk mineiro – primeiro só como produtor, e depois como cantor.
Frog tem a família dos sonhos de qualquer jovem funkeiro. A ex-professora de dança não o deixou ficar parado: “Quando eu estava em baixa, falava: ‘Mãe, não estou tendo retorno nenhum, vou ter que arrumar outra coisa para fazer’. E ela: ‘Continua, filho’. Foi ela que me fez chegar onde estou hoje”.
Ele colabora com a produtora A2M desde os 14 anos, produziu vários amigos, mas só recentemente perdeu a vergonha de cantar.
MC Frog
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‘Achei que estava horrível’
Em 2019 ele emplacou como DJ o sucesso “Maldita de ex”, cantada pelo MC Leozin, com mais de 120 milhões de views no YouTube. Mas foi durante a pandemia que Frog acertou a mão como autor e cantor, em faixas como “Escureci sua família”, “Chifre é uma coisa” e “Golpe trocado”, hits de TikTok.
Entre várias faixas que foram bem, ele não esperava que “Sentadona” seria a maior. “Eu nem queria divulgar porque gosto de gravar as paradas certinhas. Achei que estava horrível. Tudo gravado no celular. Mas em dois dias ela já tinha viralizado”, ele se impressiona.
O hit deixou o mineiro mais seguro. Ele acabou de lançar “Manda a localização” com a estrela teen do piseiro Brisa Star. “Eu toco violão, cavaquinho, teclado, gosto de fazer parceria e não quero ficar só no funk”, adianta.