Quadro Amazônia Bonita é um projeto da Rede Amazônica onde são contadas histórias de pessoas que fazem a diferença na vida de quem mora na região Amazônica. Thiely e Carlos Henrique dão aulas gratuitas para mulheres no Conjunto Habitacional Cidade do Povo
Reprodução/Rede Amazônica Acre
Será que existe idade para recomeçar? Pois é, o casal Thiely Mariano Sá e Carlos Henrique acho que não, que todo dia é dia de aprender, de se reinventar, e foi pensando nisso, em ajudar o próximo, que eles resolveram criar um projeto social que ensina mulheres que moram no Conjunto Habitacional Cidade do Povo, uma das comunidades carentes de Rio Banco, a ler e escrever.
O quadro Amazônia Bonita é um projeto da Rede Amazônica onde vão ser contadas, todos os sábados, histórias de pessoas que fazem a diferença na vida de quem mora na região Amazônica.
Antes de ler um livro, primeiro a pessoa conhece o título, as primeiras palavras que apontam um pouco da história, o apresentado aqui é o Cortiço, um clássico da literatura brasileira. Mas, o título da história contada nesta reportagem ainda está sendo escrito. Só que ela começa com o sonho de pessoas que queriam aprender e a coragem de um casal disposto a ensinar.
Thiely e Carlos Henrique são de uma ONG missionária e desenvolvem um projeto social na Cidade do Povo que atende mulheres que querem aprender a ler e a escrever.
“A gente tem um projeto social que funciona aos domingos e toda vez que a gente falava sobre ler a bíblia, sobre ler alguma coisa, sempre algumas delas levantavam a mão e diziam: ‘e quem não sabe ler?’ E elas começaram a ficar bem constrangidas e a gente até parou de falar sobre ler”, lembra Thiely.
Mulheres do Conjunto Habitacional Cidade do Povo são alfabetizadas por casal missionário
Reprodução/Rede Amazônica Acre
A Thiely não desistiu de pensar em uma forma de ajudar essas mulheres e, a partir daí, criou um projeto junto com o marido que alfabetiza adultos.
“Tem um amigo nosso parceiro que tem o Instituto Ibraema, que é em Recife, e esse Ibraema trabalha com educação de adultos. Nós fomos capacitados no final do ano e eles fornecem todos os livros”, diz a missionária.
O projeto funciona há três meses em um prédio cedido pela comunidade. E com poucos materiais, todas às terças-feiras, durante duas horas, o casal ensina mulheres que nunca é tarde para escrever um novo capítulo.
E o que os professores aprendem? Carlos Sá diz que é gratificante poder ajudar o próximo. “A gente aprende quanto é especial cada indivíduo, cada um na sua essência.”
Amazônia Bonita: casal de missionários alflbetiza mulheres na Cidade do Povo
Mais do que livros e cadernos: esperança
Thiely e o marido oferecem muito mais do que livros e cadernos. Eles oferecem esperança para essas mulheres, uma oportunidade que elas precisam para voltar a sonhar. E são muitos os sonhos guardados.
A dona Antônia tem 67 anos e não sabe ler, ela morou na zona rural até os 40 anos e quando se mudou para a zona urbana até chegou a ir à escola, mas desistiu. No projeto, ela já consegue reconhecer as letras.
“Eu já reconheço essas letras todas, só não sei ainda juntar para soletrar, a minha dificuldade é essa”, fala.
E os novos professores ganharam um lugar especial na vida da dona Antônia. “Eu tenho eles igual a um pai e uma mãe.”
Adriana Cavalcante tem 26 anos e sonha aprender a ler e escrever para poder fazer uma faculdade
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A dona de casa Adriana Cavalcante da Silva tem 26 anos e também morou na zona rural. Ela chegou a frequentar a escola, mas não terminou os estudos. Para ela, a leitura é a principal dificuldade. Ela também está aprendendo a ler e escrever o próprio nome, letrinha por letrinha.
“Eu ia formando [palavras] devagarzinho, porque, tipo assim, era pouquinha coisa. É muito ruim a gente não saber direito, eu vi uma porta aberta e aproveitei para aprender mais”, afirma.
Por enquanto, o sonho de Adriana é aprender a ler e escrever, porém, ela já tem outros no papel.
“Queria aprender para fazer uma faculdade mais para frente, para eu poder abrir o próprio negócio, como eu já fiz de bolo e pão. Queria fazer e aprender para quando surgir mais oportunidade eu aproveitar.”
Raimunda Silva quer aprender a ler e escrever para ajudar os filhos nas tarefas da escola
Reprodução/Rede Amazônica Acre
A trajetória da dona de casa Raimunda da Silva de Souza, de 47 anos, é parecida com a da dona Antônia e a de Adriana. Ela morou na zona rural, onde era mais difícil ir à escola. Dona Raimunda conta que sabe ler um pouco, mas que a escrita é um obstáculo. “Não sei escrever, não sei fazer meu nome direito, não sei.”
Raimunda tem 11 filhos e todos estão na escola. Ela fala que quando eles pedem ajuda nas tarefas, roga por sabedoria.
“Quando vem um filho e pede, ‘mãe, me ensina essa tarefa’? Aí eu digo, ô meu Deus, me dê sabedoria para eu ensinar meus filhos, para que eu possa ensinar, eu não sei! Aí ele diz, ‘tá bom, mãe’! Aí as outras [irmãs] vão e ensinam e fica tudo bem. Mas eu digo que vou aprender um dia e vou ensinar vocês”, garante.
A recompensa para o casal de professores que leva conhecimento para essas mulheres é bem simples.
“O amor, cara, o amor, a gente está se reunindo como pode, a gente não espera ter para fazer, a gente faz com o que tem, cadeiras emprestadas, quadro em cima da cadeira, um pincel que a gente vai na papelaria e traz e começa ali, a dar esperança para as pessoas.”
A história do livro que começou a ser escrito pela Thiely, Carlos Henrique, dona Antônia, Adriana, dona Raimunda e essas outras mulheres pode não ter título ainda, mas pode virar uma pergunta. Será que existe idade para recomeçar?
Casal diz que ajuda as mulheres apenas por amor ao próximo e que não existe recompensa melhor do que essa
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