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Festas e Rodeios

Álbum ‘Drama’, de Maria Bethânia, chega aos 50 anos como atestado da veracidade da voz da intérprete

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Capa do álbum ‘Drama – Anjo exterminado’ (1972), de Maria Bethânia
Lucinda Rato
♪ MEMÓRIA – “Drama / E ao fim de cada ato / Limpo num pano de prato / As mãos sujas do sangue / Das canções”, avisou Maria Bethânia nos versos finais de Drama (1972), a canção do mano Caetano Veloso com que encerrou o segundo lado do álbum Drama – Anjo exterminado – ou segundo ato, como exposto na contracapa interna do LP editado originalmente em novembro de 1972 pela gravadora Philips com capa dupla que expôs a cantora em foto expressiva de Lucinda Rato.
Decorridos 50 anos, o álbum Drama – Anjo exterminado permanece como uma das mais completas traduções da teatralidade do canto da intérprete, verdadeira baiana de Santo Amaro da Purificação (BA).
Gravado no estúdio Eldorado, na cidade de São Paulo (SP), com produção musical orquestrada por Caetano Veloso (em um dos primeiros trabalhos do artista após a volta ao Brasil do exílio em Londres), com arranjos de Perinho Albuquerque, Drama – Anjo exterminado é o primeiro álbum de estúdio de Bethânia após a consagração de Rosa dos ventos – O show encantado (1971), espetáculo do ano interior no qual a cantora consolidara a fórmula cênica que vinha experimentando desde 1967 sob a batuta do diretor e ator de teatro Fauzi Arap (1938 – 2013).
Aberto com ponto recolhido do folclore da Bahia em que Bethânia já mandou recado aos ditadores da época (“Sou eu que me deito tarde / Sou eu que levanto cedo / Sou eu que realço tudo / Sou eu que não tenho medo”), o primeiro ato de Drama alinhou músicas que permaneceriam no repertório de Bethânia.
Primeiro sucesso popular da cantora após o alto voo teatral de Carcará (João do Vale e José Cândido, 1964) que lhe dera projeção nacional em 1965, Esse cara (1972) flagrou Caetano Veloso possuído por alma feminina ao escrever a letra de estilo buarquiano que também se afinou com as emoções do vasto séquito gay que segue Bethânia desde aquela época.
Emoldurada por cordas, a canção Esse cara foi alocada, na costura fina do disco, na mesma faixa da valsa Bodas de prata (Roberto Martins e Mario Rossi, 1945), propagada originalmente pelo cantor Carlos Galhardo (1913 – 1985) na era do rádio e revivida por Bethânia em tempo de delicadeza.
Influenciada pelos teatros das canções dessa era radiofônica, Bethânia sempre se permitiu dar voz ao ridículo da vida, o amor, incluindo em Drama um samba-canção, Bom dia (1942), da obra folhetinesca do compositor Herivelto Martins (1912 – 1992) em parceria com Aldo Cabral (1912 – 1994). Trinta anos após o registro original da cantora Linda Batista (1919 – 1988), o arranjo orquestral da gravação de Bom dia por Bethânia ecoou a ambientação sonora de um salão dourado dos anos 1950.
Mantendo aberta a cortina do passado, Bethânia também caiu no samba Volta por cima (Paulo Vanzolini, 1962), standard do repertório do cantor Noite Ilustrada (1928 – 2003) que frequentemente ainda reaparece nos roteiros dos shows da cantora.
Ainda dentro do primeiro ato de Drama, Bethânia apresentou Anjo exterminado (1972), canção que compôs a segunda metade do título do álbum. Trata-se de música então inédita da recente parceria de Jards Macalé – artista com quem Bethânia já se conectava desde os anos 1960 – com Waly Salomão (1943 – 2003), poeta e compositor que se tornaria nome recorrente na discografia da cantora.
Fechando o primeiro ato, Bethânia elevou a teatralidade do disco ao interpretar fado do repertório da cantora Amália Rodrigues (1920 – 1999), Maldição (Alfredo Duarte e Armando Vieira Pinto, 1950), com fidelidade ao tom dramático do tema, mas com arranjo que caiu na batida de um samba fúnebre, em sintonia com a letra sombria que versava sobre “mortas esperanças”.
Com passagens em que Bethânia canta a capella, a gravação de Maldição culminou com a repetição dos versos “Somos dois gritos calados / Dois fados desencontrados / Dois amantes desunidos”, dando outra (grande) dimensão ao fado popularizado por Amália Rodrigues em 1967, em um dos grandes efeitos dramáticos do disco.
Na abertura do segundo ato, dominado por músicas então inéditas, Bethânia fez o santo baixar ao cantar Iansã (Gilberto Gil e Caetano Veloso, 1972), música que ouvintes das novas geração talvez identifiquem com o canto de Alice Caymmi por conta da impactante gravação apresentada no álbum Rainha dos raios (2014).
Na sequência, a intérprete saltou de banda por Trampolim (1972) – samba em que Bethânia se apresentou pela primeira vez como letrista, assinando os versos da música criada por Caetano Veloso – e cantou Negror dos tempos (Caetano Veloso, 1972) com arranjo de big band em que sobressaiu o toque do sax alto de Eduardo Pecci, o Lambari, músico convidado da faixa.
Gravado com os toques de músicos como Antônio Perna (piano) e Tutty Moreno (bateria), além do violão e da guitarra de Perinho Albuquerque (arranjador que criaria em 1978 a moldura orquestra de Álibi, LP blockbuster da discografia de Bethânia), o álbum Drama – Anjo exterminado trouxe o conjunto Terra Trio na gravação do então inédito samba Estácio Holly, Estácio (1972), péroa negra de Luiz Melodia (1951 – 2017), o original compositor apresentado por Gal Costa no show anterior Fa-Tal – Gal a todo vapor (1971).
Já O circo (1972) era samba da lavra do compositor baiano Oscar da Penha (1924 – 1997), o Batatinha, apresentado ao Brasil por Bethânia no ano anterior no show Rosa dos ventos (1971).
Extremamente fiel ao universo teatral de Maria Bethânia, o álbum Drama – Anjo exterminado – disco que rendeu o show perpetuado no ano seguinte no álbum ao vivo Drama 3º ato – Luz a noite (1973) – chega aos 50 anos como um recorte atemporal da veracidade do canto dessa intérprete magnética cuja voz nunca mente.
♪ Leia outros textos da série memorialista do Blog do Mauro Ferreira sobre grandes álbuns de artistas brasileiros que fazem 50 anos em 2022:
1. Segundo álbum londrino de Caetano Veloso, ‘Transa’ faz 50 anos como objeto de culto na obra do artista
2. Álbum de 1972 em que Gilberto Gil festejou a volta do exílio, ‘Expresso 2222’ faz 50 anos com combustível para alcançar futuras gerações
3. Álbum com que Elza Soares pediu passagem para o samba-soul faz 50 anos com vitalidade
4. ‘Clube da Esquina’, álbum que mostrou admirável mundo novo à MPB, conserva a chama da juventude aos 50 anos
5. Carnaval de Chico Buarque ainda faz sentido 50 anos após disco com trilha sonora de filme de 1972
6. ‘Elis’, álbum de 1972, faz 50 anos com o brilho intacto pela perfeição de canto, repertório e arranjos
7. Álbum do MPB4 em 1972, ‘Cicatrizes’ expõe feridas ainda abertas no Brasil após 50 anos
8. Obra-prima do grupo Novos Baianos, álbum ‘Acabou chorare’ faz 50 anos com o frescor de 1972
9. Álbum de Paulinho da Viola em 1972, ‘A dança da solidão’ faz há 50 anos a síntese da obra do artesão

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Rodrigo Campos permanece no lugar de bamba paulista com ‘Pode ser outra beleza’, álbum pautado pelo samba

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Disco fecha trilogia de estética minimalista com ecos de João Bosco no inédito repertório autoral. Capa do álbum ‘Pode ser outra beleza’, de Rodrigo Campos
Arte de Romulo Fróes
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Pode ser outra beleza
Artista: Rodrigo Campos
Cotação: ★ ★ ★ ★
♪ No samba Pavio de felicidade, primeira das oito músicas inéditas que compõem o repertório autoral de Pode ser outra beleza, álbum que Rodrigo Campos lança na quinta-feira, 3 de outubro, via YB Music, o compositor cita Nelson Cavaquinho (1911 – 1986) e Paulinho da Viola na letra em que versa sobre “Um pedaço de fio / Um pequeno pavio de felicidade / Melodia sutil / Rarefeito assovio da mortalidade”.
Esses versos dizem muito sobre o disco com que o cantor, compositor e músico paulistano fecha trilogia iniciada com o estupendo álbum 9 sambas (2018) e continuada com o disco Pagode novo (2023).
Pode ser outra beleza é álbum de voz, violão e eventual percussão, de atmosfera minimalista, em que a beleza que extasia a alma – traduzida na expressiva ilustração exposta na capa criada por Romulo Fróes – também pode vir de dentro.
“Um álbum que se anuncia com essa imagem pode estar dizendo sobre o ‘descuido’ que nos traz para o presente, para nossas vidas. O deslumbramento com a beleza fora, mas sem perceber que somos vistos como beleza também”, aponta Rodrigo Campos.
A observação faz sentido porque, em Pode ser outra beleza, o encanto parece estar dentro das canções e do violão de Campos, cujo toque pode tanto evocar o suingue de João Bosco, sobretudo na levada do samba Amar à distância, como soar como mantra no loop abrigado dentro de Chapéu lilás.
Entre uma e outra faixa, o artista parte da Bahia fantástica – território de álbum de 2012 – para defender em Seu lugar a beleza concreta da arquitetura e do samba de Sampa, berço deste bamba criado em São Mateus, bairro periférico da zona leste da cidade de São Paulo.
Retrato das sombras da alma, Um xanax capta a ansiedade da metrópole com arranjo preciso que oscila entre a calma obtida pela química e as angústias incontroláveis da mente.
Já Cadê meu dinheiro? põe na pauta a luta pela sobrevivência que faz o samba (e a mente) atravessar enquanto o samba Musashi na feira parece dialogar com o universo temático do álbum Conversas com Toshiro (2015) sem deixar de estar afinado com a estética minimalista e a geografia paulistana do disco Pode ser outra beleza.
Por fim, o samba Matéria do sonho afasta as sombras e vai para onde tem sol, funcionando como pequeno pavio de felicidade na safra autoral de Pode ser outra beleza, álbum que mantém Rodrigo Campos no lugar de bamba paulista do século XXI.

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Suga, membro do BTS, é multado em US$ 11.500 por dirigir embriagado scooter elétrica

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Em agosto, o membro do BTS pediu desculpas pelo incidente, chamando-o de “comportamento descuidado e errado”, e a polícia também revogou sua licença por dirigir a scooter elétrica bêbado. Suga, da banda sul-coreana BTS, em evento em Seul, na Coreia do Sul
Kim Hong-Ji/Arquivo/Reuters
O astro do K-pop Suga , membro do supergrupo BTS, foi multado em 15 milhões de wons (US$ 11.500) por um tribunal por dirigir embriagado um patinete elétrico.
Um juiz do Tribunal Distrital Ocidental de Seul emitiu a multa em um julgamento sumário feito na semana passada, depois que seu caso foi encaminhado à promotoria, disse um funcionário do tribunal nesta segunda-feira (30).
Em agosto, o compositor e rapper pediu desculpas pelo incidente, chamando-o de “comportamento descuidado e errado”, e a polícia também revogou sua licença por dirigir a scooter elétrica bêbado.
Suga andou de scooter e tropeçou ao estacionar à noite, de acordo com sua gravadora Big Hit Music, que faz parte da empresa de K-pop HYBE 352820.KS. A gravadora também disse que ele falhou em um teste de bafômetro para medir seu nível de álcool no sangue conduzido pela polícia.
Desde que anunciaram uma pausa nos projetos do grupo em junho de 2022, os membros do BTS buscaram atividades solo antes de iniciar o serviço militar.
Suga, de 31 anos, está envolvido em trabalhos de serviço social para cumprir seu compromisso com o serviço militar.
O incidente de dirigir embriagado é o exemplo mais recente de artistas de K-pop que às vezes não conseguem manter sua imagem impecável.
O caso deixou alguns fãs do BTS chateados com sua ação de enviar coroas de flores perto da sede da HYBE, com mensagens em painéis pedindo que ele deixasse a banda.
Aqueles notificados de julgamentos sumários podem solicitar um julgamento regular dentro de sete dias para contestar a decisão.
A gravadora de Suga não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
VEJA MAIS EM:
Semana Pop explica como funcionam as carreiras solo no k-pop

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Eminem falou de acusações contra Sean ‘Diddy’ Combs em disco lançado meses antes da prisão do rapper

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Sean ‘Diddy’ Combs foi preso no dia 16 por acusações de tráfico sexual e agressão. Ele é alvo de várias ações civis que o caracterizam como um ‘predador sexual violento’. (Da esq. p/ dir.): Eminem e Sean ‘Diddy’ Combs
Mike Segar/Reuters/Jordan Strauss/Invision/AP
Lançado por Eminem em 12 de julho, o álbum “The Death of Slim Shady” faz referências aos processos movidos contra o rapper Sean “Diddy” Combs, preso neste mês por tráfico sexual e agressão. O disco foi o único que conseguiu desbancar Taylor Swift do topo da Billboard 200, a principal parada americana de álbuns.
Em “The Death of Slim Shady”, Eminem propõe a morte do personagem criado no início da carreira. Nas faixas, o músico transita entre o trap (vertente mais lenta do rap) e o clássico boom-bap. Ele também ridiculariza debates sobre padrões de beleza, diversidade, inclusão, linguagem neutra e direitos de pessoas transgênero, além de mencionar famosos como Combs, rapper mais conhecido como Puff Diddy, ou P. Diddy.
Caso Diddy: entenda o que é fato sobre o caso
Fuel
Em “Fuel”, Eminem canta: “I’m like a R-A-P-E-R / Got so many S-As / Wait, he didn’t just spell the word, “Rapper” and leave out a P, did he? (Yep) / R.I.P., rest in peace, Biggie / And Pac, both of y’all should be living”.
Em português, os versos dizem: “Sou como um estuprador / Tenho um monte de BOs / Espera, ele soletrou mesmo rapper só que sem um p? (Aham) / Descanse em paz, Biggie / E Pac, vocês dois deveriam estar vivos”.
Sonoramente, o trecho “P, did he?” soa como “P. Diddy”, que é alvo de várias ações civis que o caracterizam como um “predador sexual violento”. Ele é acusado de usar álcool e drogas para submeter as vítimas aos abusos. Suas residências foram alvo de buscas por agentes federais neste ano.
Sean ‘Diddy’ Combs durante um evento em 2018
Richard Shotwell/Invision/AP/Arquivo
Antichrist
Já em “Antichrist”, o cantor diz: “Ghastly, and insidious as me, or spitting as nasty?/ Next idiot ask me is getting his ass beat worse than Diddy did”.
“Horrível e traiçoeiro como eu, ou cuspindo tão maldoso?/ O próximo idiota que me perguntar vai apanhar mais do que o Diddy fez com…”
Os versos são uma possível referência à denúncia da cantora Cassie contra Diddy. No fim de 2023, ela o acusou de submetê-la por mais de uma década a coerção física e drogá-la, além de estuprá-la em 2018.
Um vídeo de uma câmera de segurança em um hotel mostra o rapper agredindo fisicamente Cassie, que era sua namorada da época. Nas cenas, ela é arrastada pelo cabelo e tenta fugir.

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