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Fernanda Porto, voz do drum and bass brasileiro há 20 anos, se revigora como cantora no álbum ‘Contemporâne@’

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Artista lança disco em que expõe a beleza por vezes oculta de músicas e letras de compositores jovens como Jão, Bemti, Chico Chico, Mallu Magalhães, César Lacerda, Mahmundi e Rubel. Capa do álbum ‘Contemporâne@a’, de Fernanda Porto
Milena Rosado
Resenha de álbum
Título: Contemporâne@
Artista: Fernanda Porto
Edição: Joia Moderna
Cotação: ★ ★ ★ ★
♪ Antes de Fernanda Porto ser jogada na pista em 2002 como uma das vozes brasileiras do drum and bass, gênero de música eletrônica ao qual qual foi apresentada pelo DJ e produtor Xerxes de Oliveira, a artista paulista já tinha cumprido expediente como cantora em shows feitos na cidade de São Paulo (SP) ao longo dos anos 1990 com repertório que podia incluir sucessos da MPB, do pop nacional e mesmo canções autorais.
Contemporâne@ – álbum de voz e piano que Fernanda Porto lança hoje, 10 de agosto, em edição da gravadora Joia Moderna – marca o reencontro da cantora com o passado pré-fama. Desprezada pela indústria do disco quando o drum and bass foi perdendo espaço nas pistas para outras batidas eletrônicas, Porto teve a carreira descontinuada ao longo dos anos 2010 como efeito do que caracteriza como “bullying” do mercado fonográfico.
Desde então, a artista tinha apresentado somente um álbum, Corpo elétrico e alma acústica (2020), de repertório autoral.
Álbum gravado ao vivo em duas sessões no estúdio Giramundo, em 17 e 18 de junho de 2022, sob direção artística do DJ Zé Pedro, Contemporâne@ revigora a discografia de Maria Fernanda Dutra Clemente, cantora e instrumentista de 56 anos.
No disco, conceituado por Porto como um “renascimento”, a cantora e pianista joga luzes sobre emoções reais da produção autoral de compositores brasileiros projetados no século XXI – a maioria na populosa e volátil cena indie, com visibilidade restrita a nichos.
Jão e Mallu Magalhães são as exceções. De Jão, príncipe pop da sofrência que põe multidões aos pés do cantor com estampa de galã, Fernanda Porto canta a balada Olhos vermelhos (2021), destaque da safra autoral do terceiro álbum de estúdio de Jão, Pirata (2021).
De Mallu, a intérprete realça Fases da lua (2021), realçando a boa canção que ficara escondida na gravação feita pela autora no álbum Esperança (2021) com batida de samba e flerte com o trip hop.
Fernanda Porto lança hoje o sexto álbum, ‘Contemporâne@’, gravado sob direção artística do DJ Zé Pedro
Ana Alexandrino / Divulgação
Por vezes desvalorizado nos registros originais pela opacidade do canto de alguns desses artistas ou pela excessiva ênfase na sonoridade em detrimento da música, todo o repertório do álbum Contemporâne@ ganha viço na voz afinada de Fernanda Porto, iluminando melodias e letras que invariavelmente têm o que dizer. E dizem.
Para atestar a supremacia da maioria das 11 gravações, basta ouvir Livramento (Bemti e Nina Oliveira, 2021), canção interpretada por Porto com precisão, dando voz às angústias encobertas na gravação original da música apresentada por Bemti no álbum Logo ali (2021).
Para quem nunca ouviu o belo terceiro álbum solo de César Lacerda, Tudo tudo tudo tudo (2017), a audição da canção Por que você mora assim tão longe? (2017) pode surpreender pela beleza que atesta o (grande) talento do artista mineiro como compositor.
Haverá surpresa também em quem ignora que Paulo Vieira – artista mais conhecido como ator e humorista – é também cantor e compositor. De Vieira, Porto dá voz à confessional Mãe Sampa, ponto luminoso no arco do álbum Contemporâne@ pelo encanto da melodia e pela letra em que o compositor, nascido em Goiás e criado no Tocantins, versa sobre as dores e delícias de ser mais um na multidão de estranhos solitários da cidade de São Paulo (SP).
Música que batizou o álbum solo lançado por Chico Chico no ano passado, Pomares (2021) floresce e reitera a habilidade de Fernanda Porto para ir na essência das canções, sem firulas no canto e no toque do piano.
A precisão da cantora também salta aos ouvidos em Nós de fronte (Castello Branco e Mahmundi, 2020), Pra bem perto de mim (Guilherme Held e Rubel, 2020) e na inédita A vida não é bela (Arthur Nogueira, 2022) – composições em que as letras pulsam em frequência mais forte do que as das melodias – e se impõe como o grande trunfo do álbum Contemporâne@.
Música composta por Bárbara Eugenia para disco abortado por Wanderléa e apresentada pela autora no álbum Crashes n’ crushes (2021), a canção O amor se acabou também ganha a voz e o piano de Fernanda Porto em Contemporâne@, disco fechado em alto estilo com Amelia Rosa (2019), composição de Bruno Berle.
Neste reencontro com a cantora seminal dos anos 1990, ou neste “renascimento”, como prefere a artista ao conceituar o álbum Contemporâne@, Fernanda Porto se prova intérprete relevante, capaz de fazer brotar sentimentos verdadeiros no canto sem se esconder atrás de batidas sintéticas.
Não dá mais para voltar no tempo perdido com os desmandos de gravadoras, mas ainda é tempo de retomar a carreira a partir deste novo cintilante ponto de partida.
Fernanda Porto apresenta interpretações precisas de músicas como ‘Livramento’, de Bemti e Nina Oliveira
Ana Alexandrino / Divulgação

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