Connect with us

Coisas do Mato

Agroecologia e ‘recaatingamento’ transformam paisagem e vida de famílias no Sertão

Published

on

Projeto socioambiental em Caiçarinha da Penha trabalha na restauração do bioma e oferece, através de um instituto com foco na produção agrícola sustentável, oportunidade para mais de 40 famílias da zona rural de Serra Talhada. Sistema agroflorestal ajuda a manter agrícola da comunidade, sem impactos negativos a Caatinga
Ezequiel Quirino/TV Globo
“Quando eu acordo, antes das 5h da manhã, eu abro a janela e olho para a Caatinga, sinto o cheiro dela. Cheiro gostoso! Escuto o som dos passarinhos cantando, quando amanhece o dia”.
O depoimento é da agricultora familiar Lucineide Ferraz, 49 anos, apaixonada pela região em que vive e preocupada com o futuro: “me preocupo bastante com o desmatamento. Está acabando com tudo”. Quando questionada sobre o que a Caatinga representa para ela, a resposta é direta: “a vida”.
Compartilhe no WhatsApp
Compartilhe no Telegram
Perguntada sobre sonhos, ela diz ter um: “fazer faculdade sobre algo da Caatinga, que é o que eu mais gosto, e dos animais”.
É com os olhos marejados de encantamento que ela fala da sua relação com o bioma. Em Pernambuco, há mais de 3 milhões de hectares de área de Caatinga desmatada. Além disso, apenas 2,65% da Caatinga de Pernambuco estão em área de preservação integral.
Lucineide Ferraz transforma os frutos da Caatinga em doces e geleias
Caroline Rangel/TV Globo
Lucineide é uma das 13 mulheres que trabalham no Instituto Serra Grande, localizado no distrito de Caiçarinha da Penha, na zona rural, a 43 quilômetros de Serra Talhada, no Sertão.
O projeto, que existe desde 2019, reúne 40 famílias das comunidades de Barreiros e Santana, num trabalho socioambiental – que é a recuperação e restauro de áreas desmatadas da Caatinga – e de agroecologia, preservando e aproveitando os frutos e folhas da vegetação do bioma, para gerar renda às famílias locais.
LEIA TAMBÉM:
PE tem mais de 3 milhões de hectares de área desmatada de Caatinga
Apenas 2,65% da Caatinga de PE estão em área de preservação integral
A agricultora familiar, junto às colegas do Instituto, aproveita os insumos oferecidos pela Caatinga, como o umbu, o caju, o alecrim do mato e a quebra-faca, para fazer geleias, conservas, vinagres e bebidas fermentadas. Elas produzem 50 potes de produtos por dia e vendem em feiras, entre as comunidades, e pela internet.
Para fazer as receitas dos doces tudo é aproveitado. Enquanto a fruta é desidratada, o mel do caju é usado pra fazer licor. O umbu, colhido do pé, também é levado para casa, onde a produção acontece.
Instituto produz doces dos frutos Caatinga, como caju e umbu
Caroline Rangel/TV Globo
Há um ano, Tota Cavalcante começou a trabalhar no instituto. E assim como Lucineide, ela vê o projeto como um grande passo, para realização de sonhos.
“A pessoa pode juntar um dinheiro, juntar um pouco para o futuro, para quando estiver mais velho ter um dinheiro junto, para não depender dos outros. Meu sonho é fazer uma faculdade no futuro quando eu estiver podendo mais”, disse Tota, explicando que deseja fazer o curso de letras, para se tornar professora de português.
Agricultora Tota Cavalcante junta dinheiro que ganha pelo trabalho no instituto, para estudar no futuro
Caroline Rangel/TV Globo
O trabalho desenvolvido pelas mulheres da comunidade é presidido pela agricultora familiar Creuza Ferraz, de 69 anos. Aos 10 anos de idade, ela já trabalhava com agricultura.
Líder da Associação de Moradores da comunidade de Santana, no distrito de Caiçarinha da Penha, em Serra Talhada, Creuza tem facilidade para dialogar com as mulheres e famílias que vivem na área, principalmente sobre a importância das mulheres da região terem seu próprio trabalho, e pensarem num futuro melhor para elas e para o ecossistema em que estão inseridas.
“Aqui tudo é na base da mão. Não tem nada industrializado, e nem nós queremos. Nós queremos fazer artesanalmente, porque valoriza. É agricultura familiar”, pontuou a presidente.
O projeto do Instituto foi pensado desde 2003. Dona Creuza e outras mulheres da comunidade chegaram a fazer curso no Sebrae, para aprender a fazer doces, mas só em 2019, depois de muitos testes e estudos com frutas da região e da vegetação da Caatinga, começaram a fazer as geleias e compotas como um negócio local.
“Eu fui a primeira a fazer uma geleia de acerola, e deu certo. Aí eu mostrei no grupo, que as meninas criaram para a gente se comunicar. Aí, uma amiga minha fez outra em casa, deu certo também. Então, a gente começou fazendo em casa, com o aprendizado que a gente teve lá [no Sebrae]”, contou dona Creuza, enquanto mexia um doce de passa de caju.
Presidente do Instituto Serra Grande, Creuza Ferraz diz que projeto a valoriza agricultura, sem agredir a Caatinga
Caroline Rangel/TV Globo
O preço dos produtos varia de R$8 a R$30. São pelo menos oito horas de trabalho por dia para dar conta da produção. Todo trabalho feito pelas mulheres acontece na Fazenda Serra Grande, uma propriedade privada de 1.260 hectares, com 800 hectares de Caatinga preservada e 260 hectares de área reflorestada.
As terras são do coordenador do projeto socioambiental Serra Grande, Álvaro Ferraz. A área é da família dele desde a época do império, e sofreu com períodos de seca e degradação. Em 2019, quando decidiu morar em definitivo no local, resolveu abrir as portas da fazenda, incentivar as mulheres da região a enxergar oportunidade através da caatinga e orientar os agricultores sobre como é possível viver em harmonia com a terra.
“Essa área foi antropizada, ela foi utilizada por um método de agricultura que queimava, que compactava o solo, que salinizava o solo”, afirmou o coordenador, que tem um viveiro com 26 mil mudas nativas da caatinga, entre frutíferas e cactos, para reflorestamento.
Mais de 26 mil mudas de plantas nativas da Caatinga serão plantadas na região de Caiçarinha da Penha, para restaurar solo degradado
Ezequiel Quirino/TV Globo
As mudas são utilizadas na área da fazenda que um dia foi lavoura, em um sistema chamado de agroflorestal, onde espécies ameaçadas da caatinga dividem espaço com a plantação de feijão e mandioca, por exemplo. São grandes faixas de plantio com espécies alternadas.
A técnica é importante tanto no processo de recuperação do solo do bioma, como na prática da agroecologia, vivenciada pelas mulheres do instituto.
“A raiz da tuberosa, da mandioca, expande na terra. Então, quando chove, o fato desse solo não ser mais compactado ajuda para que a água da chuva, em vez de escorrer, infiltre. Então, a gente já tem um risco zero de erosão numa área como essa, porque a gente tem um poder de infiltração enorme. Justamente por causa dessas linhas de árvore que estão fazendo o processo de bombear água para o subsolo”, explicou Álvaro.
O sistema agroflorestal utilizado na fazenda é um experimento que ocupa 2,5 hectares de área. A expectativa é de que no próximo ano essa área seja expandida e ocupe 200 hectares de área, que poderá ser utilizada pela agricultura, mas sem impactos negativos à Caatinga.
Sistema agroflorestal é experimento para manter atividade agrícola, sem agredir vegetação da Caatinga
Ezequiel Quirino/TV Globo
“Recaatingamento”
O projeto socioambiental Serra Grande foi criado por Álvaro em 2003, pela inquietação com os impactos da seca na vida dos sertanejos e pela vontade de ver o bioma, exclusivamente brasileiro, vivo em Serra Talhada.
As mudas nativas do bioma, utilizadas no sistema agroflorestal e para agricultura sustentável, também ajudam a recuperar áreas degradadas da Caatinga, por causa das queimadas, pastagem e criação de caprinos, prática comum no Sertão.
Mas, de acordo com o coordenador do projeto, apenas o plantio de mudas nas áreas desmatadas não é suficiente para restaurar o bioma.
Para o trabalho do “recaatingamento”, como costumam chamar, é fundamental a presença da fauna. Álvaro conta que mais de 2 mil espécies nativas da caatinga já foram soltas na área da fazenda, pelo Ibama. E é essa prática, junto ao reflorestamento, que faz o bioma se recuperar.
“Hoje a gente vê crescer uma floresta. É com essa diversidade, com a ajuda da fauna, dos ventos, por isso que também é tão importante a gente ter a soltura desses animais, porque eles também ajudam nesse restauro também. O passarinho come uma semente aqui, mas, se você olha os pés do Juazeiro, por exemplo, vê que tem um Mandacaru dentro. Isso é efeito da dispersão da semente pelos pássaros. Eles usam Juazeiro, que é uma das plantas que demoram a perder copa, é a melhor sombra para ele. Ele come a fruta do Mandacaru e vai se abrigar no Juazeiro. Aí cria uma simbiose, nasce sempre um pé de Mandacaru dentro de um pé de Juazeiro”, detalha Álvaro, pontuando a importância não só dos pássaros, mas tatus e outros animais comuns da Caatinga, para ajudar no restauro da vegetação degradada.
Ivair de Lima criava pássaros em gaiolas, e hoje entende a importância deles em liberdade para o ecossistema
Caroline Rangel/TV Globo
Além das atividades desenvolvidas na fazenda, quem trabalha no projeto também promove rodas diálogos e cursos sobre educação ambiental, para as comunidades vizinhas. Ivair de Lima tem 21 anos, e desde os 10 anos criava pássaros em gaiola.
A família, que trabalha com agricultura, participou de uma das conversas sobre a importância de manter animais como pássaros, tatus, veados e emas, soltos na Caatinga. O diálogo conscientizou Ivair.
“Eu achava bonito eles cantando na gaiola, mas agora eu crio eles soltos. É mais bonito eles voando entre as árvores. E também ajudo no restauro da Caatinga com o sistema agroflorestal, plantando mudas. É importante esse cuidado”, declarou o jovem, que também ajuda o Ibama a soltar os animais silvestres na fazenda Serra Grande.
VÍDEOS: mais vistos de Pernambuco nos últimos 7 dias

Continue Reading
Click to comment

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Coisas do Mato

Centenária árvore de Florianópolis citada no hino do município não é originária do Brasil, diz pesquisa

Published

on

By

Figueira da Praça XV é um dos principais cartões-postais da Capital de Santa Catarina. Ela foi identificada por pesquisadores da UFSC como sendo da espécie Ficus microcarpa. Árvore da Praça XV passa por processo de sequenciamento genético para descobrir origem
Tiago Ghizoni/NSC
A centenária figueira da Praça XV de Novembro, um dos cartões-postais de Florianópolis, localizada no Centro da cidade e citada inclusive no hino do município, não é originária do Brasil.
Por meio de sequenciamento genético, pesquisadores do laboratório de genética vegetal da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) descobriram que a árvore, na verdade, é natural de uma região entre Ásia tropical e Austrália. Ela foi identificada como sendo da espécie Ficus microcarpa.
✅Clique e siga o canal do g1 SC no WhatsApp
O professor de biotecnologia Valdir Stefenon, que conduziu o estudo, afirma que a descoberta resgata parte da história da cidade.
“Entendo que essa pesquisa revela uma importante face da ciência, ainda pouco conhecida, que é sua ligação com a história e a cultura”, disse.
Tema de lendas contadas há gerações pelos moradores de Florianópolis, a figueira foi plantada por volta de 1870 na área que atualmente abriga a escadaria da Catedral, também no centro da cidade. Cerca de 20 anos depois, em 1891, ela foi transplantada para a praça e desde então serviu de sombra aos viajantes, além de palco para festividades.  
Leia também:
Projeto cataloga Imbuias gigantes, espécie símbolo em risco de extinção
Árvores de ‘espécies exóticas invasoras’ com proibição de plantio em SC
Árvore da Praça XV em Florianópolis
Tiago Ghizoni/NSC
Como foi feita a pesquisa
Para a descoberta, os pesquisadores coletaram partes pequenas da árvore quem contêm genomas de cloroplastos. A substância pode ser encontrada, por exemplo, nas folhas de plantas. A partir disso, o material foi colocado em um equipamento de alta tecnologia que identificou e mostrou o DNA da figueira da Praça XV.
Os pesquisadores, então, puderam comparar os dados da árvore da Capital com os de outras milhares espécies registradas em um banco de dados mundial.
“O DNA é sequenciado e cada uma das milhares de bases que o compõem são identificadas em fragmentos de tamanho variados. Esses fragmentos são, então, ordenados, como se estivéssemos montando um quebra-cabeças. Nesta etapa, o genoma nuclear, o genoma do cloroplasto e o genoma das mitocôndrias são separados em análises de bioinformática”, explica o professor.
Na planta, cada um desses genomas tem sua própria função:
Nuclear: principal deles. Encontrado em todas as suas células.
Cloroplasto: responsável pela cor verde e pela fotossíntese, processo pelo qual a planta produz seu próprio alimento. Está nas folhas.
Mitocôndria: estrutura da célula que transforma em energia o açúcar que a planta produz.
Sequenciamento genético da figueira
Caroline Borges/g1
Árvore será clonada
Além do trabalho de sequenciamento genético, os pesquisadores também desenvolvem uma pesquisa para clonagem da árvore. Usando filamentos mais novos da árvore, o processo vai ajudar a perpetuar as características genéticas da atual figueira.
Segundo Stefenon, os primeiros resultados são positivos:
“A clonagem de espécies arbóreas em laboratório é um processo complexo até o momento de se estabelecer os protocolos de trabalho. Por enquanto, conseguimos estabelecer dois clones no laboratório, os quais ainda estão pequenos”, revela.
Árvore da Praça 15 em Florianópolis
Tiago Ghizoni
Ações que envolvem diagnósticos fitossanitário e nutrição, por exemplo, também estão sendo realizadas para preservar a figueira. A previsão é que elas sejam concluídas no primeiro semestre deste ano.
A figueira, segundo o professor, tende a sofrer com a poluição dos carros e a menor interação com outras plantas e animais, por estar em um ambiente bastante urbanizado.
“Apesar disso, ela está bem e, com os tratamentos que foram realizados, ela tende a permanecer bela e imponente por muitos anos na Praça XV”, avalia.
✅Clique e siga o canal do g1 SC no WhatsApp
VÍDEOS: mais assistidos do g1 SC nos últimos 7 dias
Veja mais notícias do estado no g1 SC

Continue Reading

Coisas do Mato

Marco temporal sobre terras indígenas: entenda o que dizia a tese derrubada pelo STF

Published

on

By

Julgamento começou em 2021, após recurso da Funai, e foi retomado em 21 de setembro de 2023. Dispositivo previa que indígenas poderiam reivindicar somente terras ocupadas por eles antes da Constituição de 1988, desconsiderando grupos já expulsos. Indígenas comemoram derrubada do marco temporal em Brasília
O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou nesta quarta-feira (20), por 9 votos a 2, a aplicação da tese do marco temporal na demarcação de terras indígenas. A discussão colocou em lados opostos ruralistas e povos originários, que saíram vitoriosos na disputa.
O dispositivo previa que só poderiam ser demarcadas terras que já estavam ocupadas por indígenas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Esse entendimento deriva de uma interpretação literal do artigo 231 da Constituição, que diz:
“São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.
A análise no STF começou em 26 de agosto de 2021, a partir de um recurso apresentado Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) contra o marco temporal. Nesta quarta, a pauta voltou ao plenário da Corte. O voto do ministro Luiz Fux consolidou a corrente segundo a qual o dispositivo fere a Constituição.
A demarcação de terras indígenas é um direito garantido pela Constituição Federal de 1988, que estabelece aos indígenas o chamado “direito originário” sobre as suas terras ancestrais. Isso quer dizer que eles são considerados, por lei, os primeiros e naturais donos do território, sendo obrigação da União demarcar todas as terras inicialmente ocupadas por esses povos.
👉 Esta reportagem abordará os seguintes assuntos:
Quem defendia e quem era contra o marco temporal
O impacto que teria para indígenas
Por que o caso foi parar no STF
Como votaram os ministros
Marco temporal no Congresso
STF retoma julgamento sobre marco temporal das terras indígenas
Carlos Moura/SCO/STF
1. Quem era contra e quem defendia a tese
❌ Indígenas eram contra o marco temporal. Eles afirmavam que a posse histórica de uma terra não necessariamente está vinculada ao fato de um povo originário ter ocupado determinada região antes de 5 de outubro de 1988. Segundo esse argumento, muitas comunidades são nômades, e outras tantas foram retiradas de suas terras pela ditadura militar.
❌ Para a organização não governamental (ONU) Instituto Socioambiental (ISA), a tese do marco temporal vinha sendo utilizada pelo governo Bolsonaro para travar demarcações e foi incluída em propostas legislativas anti-indígenas. Defensores da causa dos povos originários temiam que demarcações de terras já feitas fossem revogadas caso o STF validasse o dispositivo.
✔️Já proprietários rurais argumentavam que havia necessidade de se garantir segurança jurídica com relação ao tema e apontavam o risco de desapropriações caso a tese fosse derrubada.
✔️ Assim como os ruralistas, o ex-presidente Jair Bolsonaro era favorável à tese do marco temporal.
2. O impacto que poderia ter para indígenas
Análise: Os impactos socioambientais do Marco Temporal
Se a tese do marco temporal fosse aceita pelo STF, indígenas poderiam ser expulsos de terras ocupadas por eles, caso não comprovassem que estavam lá na data da promulgação da Constituição de 1988 e sem que fossem considerados os povos que já foram expulsos ou forçados a sair de seus locais de origem. Processos de demarcação de terras indígenas históricos, que se arrastavam por anos, poderiam ser suspensos.
O marco temporal também facilitaria que áreas que não deveriam ter titularidade, por pertencerem aos indígenas, protegendo física e culturalmente povos originários, pudessem ser privatizadas e comercializadas. A hipótese da comercialização respondia ao interesse do setor ruralista.
3. Por que o caso foi parar no STF

Veja, abaixo, a cronologia do julgamento:
Em 2013, o TRF-4 aceitou a tese do marco temporal ao conceder ao Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina a reintegração de posse de uma área que é parte da Reserva Biológica do Sassafrás, onde fica a Terra Indígena Ibirama LaKlãnõ. Na região, vivem os povos xokleng, guarani e kaingang.
A decisão do TRF-4 mantinha entendimento de 2009, de outra decisão da Justiça Federal em Santa Catarina.
Em 26 de agosto de 2021, o STF iniciou o julgamento de um recurso da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) que questionou a decisão do TRF-4. E o que fosse decidido pelos ministros da Corte criaria um entendimento que poderia ser aplicado em situações semelhantes em todo o Brasil.
Em 20 de setembro de 2023, o STF retomou o julgamento e derrubou a tese do marco temporal.
Após a decisão da Corte, o líder de povo Xokleng, Tucun Gakran comemorou:
“É a maior vitória dos indígenas desde quando o não indígena tomou as terras dos povos indígenas”
4. Como votaram os ministros
Votaram contra o marco temporal:
Edson Fachin (relator)
Alexandre de Moraes
Cristiano Zanin
Luís Roberto Barroso
Dias Toffoli
Luiz Fux
Cármen Lúcia
Gilmar Mendes
Rosa Weber
Dois ministros consideraram que o marco temporal deveria ser considerado no momento da demarcação de terras indígenas:
Nunes Marques
André Mendonça
5. Marco temporal no Congresso
Além do processo que corria no STF, um projeto entrou em tramitação no Congresso para tentar transformar a tese do marco temporal em lei. Trata-se do PL nº 490/2007, que determina que devem ter direito às terras consideradas ancestrais somente os povos que as estivessem ocupando no dia da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.
A proposta do legislativo altera o “Estatuto do Índio” para permitir, segundo o texto, um “contrato de cooperação entre índios e não índios”, para que estes possam realizar atividades econômicas em terras indígenas. Além disso, a proposta prevê que não indígenas tenham contato com povos isolados “para intermediar ação estatal de utilidade pública”.
Veja, abaixo, a cronologia do PL:
Em 2007, o PL foi proposto na Câmara dos Deputados.
Em 2009, o texto foi rejeitado na Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Em 2018, o PL acabou arquivado.
No entanto, ainda em 2018, a proposta foi ressuscitada durante a campanha eleitoral do ex-presidente Jair Bolsonaro, que prometeu acabar com “reserva indígena no Brasil”.
Em 29 de junho de 2021, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, presidida pela deputada Bia Kicis (PSL-DF), entendeu que o texto do PL era constitucional.
Em 30 de maio de 2023, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto, por 283 votos a 155, com apoio público do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Houve uma abstenção. O texto, então, foi para o Senado.
Em 20 de setembro de 2023, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado adiou a votação do PL. O adiamento ocorreu após a leitura do parecer favorável ao projeto, apresentado pelo senador Marcos Rogério (PL-RO), e atendeu a um pedido de vista (mais tempo para análise) coletivo de senadores da base aliada ao governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Governistas ainda tentaram postergar a análise com uma tentativa de convocar audiência pública para debater o tema, mas a base acabou derrotada por 15 votos a 8. Com isso, a votação do projeto está prevista para 27 de setembro de 2023, em data posterior à última atualização desta reportagem.

Continue Reading

Coisas do Mato

Suíça fará doações ao Fundo Amazônia, anuncia representante do país europeu

Published

on

By

Conselheiro federal da Confederação Suíça, Guy Parmelin, deu a declaração durante um fórum sobre investimentos e sustentabilidade, realizado no Itamaraty. Ele não citou valores. Guy Parmelin, conselheiro da Suíça, durante declaração à imprensa, no Itamaraty
Reprodução/TV Globo
O conselheiro federal da Confederação Suíça, Guy Parmelin, afirmou nesta quarta-feira (5) que a Suíça passará a fazer doações para o Fundo Amazônia. Ele não citou valores dos aportes.
Parmelin fez o anúncio ao lado do vice-presidente Geraldo Alckmin, na sede do Ministério das Relações Exteriores. Os dois participaram do Fórum Brasil-Suíça de Investimentos e Inovação em Infraestrutura e Sustentabilidade.
“A partir de hoje, aprimoraremos nosso engajamento. Tenho o prazer de anunciar que a Suíça vai contribuir para o Fundo Amazônia. A primeira contribuição será nas próximas semanas. Queremos lançar essa parceira com o Brasil e outros países”, afirmou o representante do país europeu.
Criado em 2008, o Fundo Amazônia recebe doações majoritariamente da Noruega e também da Alemanha. Em 2019, primeiro ano da gestão Jair Bolsonaro, os países suspenderam os repasses e congelaram os valores para novos projetos, mantendo somente os pagamentos já programados.
Além de Suíça, Estados Unidos e Reino Unido já anunciaram que farão aportes ao fundo.
Em declaração à imprensa, Alckmin agradeceu pela iniciativa dos suíços. “Muito importante para a recuperação da nossa Floresta Amazônica, [gostaria de] destacar a boa parceria econômica e as oportunidades de investimentos”, afirmou o vice-presidente.
Alckmin disse também que o Brasil tem compromisso com o desenvolvimento sustentável e o combate ao desmatamento ilegal.
“As Forças Armadas, inclusive, estão presentes na Amazônia para retirar garimpeiros ilegais, invasores de áreas de preservação. Enfim, um trabalho grande na região”, declarou o vice-presidente.
Na mesma linha de Alckmin, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, afirmou que o governo brasileiro lançará ainda em julho um novo plano de desenvolvimento para o país que terá como “pilar central” a transição energética.
“O Brasil tem desafios, problemas a superar, mas, ao mesmo tempo que temos desafios, esses desafios se apresentam como enormes oportunidades de investimento e parcerias”, afirmou o ministro.
Acordo Mercosul-EFTA
Durante os pronunciamentos desta quarta-feira, Alckmin e Parmelin citaram o acordo comercial negociado entre o Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) e a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA), da qual a Suíça faz parte.
Negociado desde 2017, o acordo com o grupo foi concluído em 2019, após dez rodadas de negociações. Ainda há, contudo, algumas pendências relativas a questões técnicas e, por isso, ainda não foi finalizado.
“Temos todo interesse em ampliar a abertura comercial e a possibilidade de investimentos recíprocos com a União Europeia e a EFTA. Com a União Europeia, o governo já está mais adiantado e estamos confiantes que chegaremos a bom termo. Com a EFTA, poderemos ter complementariedade econômica de investimentos que vão gerar emprego e renda”, disse Alckmin no fórum.
“O acordo Mercosul-EFTA é um instrumento-chave para reforçar ainda mais o potencial de cooperação entre nossos países”, acrescentou Guy Parmelin.
De acordo com a página oficial do Mercosul, o comércio entre o bloco e os países da EFTA gira em torno de US$ 7 bilhões anuais.

Continue Reading

Trending

Copyright © 2017 Zox News Theme. Theme by MVP Themes, powered by WordPress.