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Festas e Rodeios

Pablo Picasso, da genialidade artística à masculinidade tóxica

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Cinquenta anos após sua morte, legado do pintor espanhol é ofuscado por acusações de misoginia e maus-tratos contra suas esposas, musas e amantes – divididas por ele entre ‘deusas e capachos’. Imagem do trailer do documentário ‘The mistery of Picasso’
Divulgação
“Só há duas espécies de mulheres: as deusas e as capachos”: essa citação de Pablo Picasso diz muita coisa. E, de fato, a maioria de suas relações – sabe-se de 11 – passou por essa metamorfose. No início ele as endeusava, depois as tratava como escória. Duas delas, Marie Thérèse Walther e Jacqueline Roque, cometeram suicídio após a morte de Picasso.
E não é nenhuma surpresa que as críticas ao superstar da pintura do século 20 sejam cada vez maiores. “Eu acusaria Picasso de ser manipulador, de ter um viés sádico e de ter algum prazer em maltratar mulheres, fazendo a elas promessas e declarações de amor sem qualquer fundo de verdade”, comenta Ann-Kathrin Hahn, curadora do Museu Picasso de Münster, na Alemanha.
Diante disso, são principalmente as mulheres que questionam a curadora sobre se um museu ainda pode celebrar de forma acrítica um artista como esse.
Um gênio sem escrúpulos
Picasso era um gênio sem escrúpulos que faria de tudo em prol de sua carreira – até andar sobre cadáveres. É o que garantem algumas das mulheres que passaram pela vida dele.
De forma quase maníaca, ele eternizou cada uma de suas relações nas suas pinturas, desenhos, esculturas e cerâmicas. Mas, por maior que fosse o entusiasmo inicial, logo ele arrefecia. Atração e rejeição quase sempre seguiam o mesmo padrão.
A primeira amante a registrar memórias ao lado de Picasso foi Fernande Oliver, em 1933, no livro Picasso e seus amigos. Na obra, ela recorda os anos que os dois passaram juntos em Paris, de 1905 a 1913.
Obra ‘Les demoiselles d’Avignon’, de Pablo Picasso
Reprodução/www.moma.org
Quando Picasso e Oliver se conheceram, em Montmartre, ele ainda era um artista espanhol desconhecido, pobre e com um forte sotaque. Oliver se tornaria um dos principais modelos de Picasso no início da carreira dele, tendo sido retalhada em vários pedaços geométricos.
Nas obras cubistas, nariz, olhos, bochecha e outras partes do rosto são quase irreconhecíveis. Frente e verso são apresentados juntos.
Pintura misógina
Picasso criou verdadeiros marcos da arte moderna com seus retratos de Oliver. Mas ele também a tratava mal, chegando a trancá-la na casa-ateliê no Bateau-Lavoir para impedi-la de posar para outros artistas.
Quando a relação acabou, ele a abandonou na pobreza enquanto iniciava uma nova aventura com Eva Gouel.
No livro Deusas e capachos – as mulheres e Picasso, a jornalista de arte Rose-Maria Gropp investigou as perspectivas das amantes do pintor, pesquisando em diários e outras fontes não publicadas.
Gropp considera a pintura icônica Démoiselles d’Avignon, uma obra importante da fase cubista de Picasso, como uma expressão do desprezo do pintor pelas mulheres.
“É simplesmente inconcebível pensar numa pintura tão catastrófica como Demoiselles d’Avignon, de 1907, sem agressões de seu criador. Não há como. Para mim, porém, também foi interessante como as cinco mulheres encurraladas nessa imagem em tamanho real devolvem justamente essa energia destrutiva”, comenta a jornalista. Para ela, isso significa que Picasso estava ciente do poder dessas mulheres.
Para fora do pedestal
Também a historiadora da arte Abigail Solomon-Godeau vê em Picasso nada mais nada menos do que um misógino. De uma perspectiva feminista, é necessário se afastar desse tipo de artista, afirma.
Para ela, uma nova perspectiva sobre Picasso se faz necessária. “O que me interessa são as narrativas da história da arte, as narrativas sobre Picasso, sobre o grande e genial mestre. Pois é essa narrativa que é determinante para a interpretação de uma pintura”, afirma.
“A pintura que hoje vemos e que é chamada de Démoiselles d’Avignon não é a mesma pintura que as pessoas de 1907 viram. Nós a vemos, hoje, com outros olhos”, diz. E por isso a obra é questionada de uma maneira que não seria há 115 anos, completa Solomon-Godeau.
Se dependesse dela, Picasso seria derrubado do pedestal em que foi posto. Sua personalidade mediterrânea não serve de desculpa para sua masculinidade tóxica, afirma.
Também a primeira esposa de Picasso, Olga Koklova, com quem ele viveu de 1917 a 1935, foi deformada por ele em suas pinturas até virar um monstro, depois de ser poupada numa fase inicial. Uma pintura mostra Koklova dormindo num poltrona: uma figura grotesca e deformada com uma boca escancarada.
Picasso, promotor da discórdia
Françoise Gilot, com quem Picasso teve dois filhos, Paloma e Claude, descreveu os anos entre 1943 e 1954 em seu livro Minha vida com Picasso. Enquanto Fernande Olivier se viu destituída e empobrecida após a separação, Gilot, que vinha de uma família de posses, era mais madura e financeiramente independente. Ela conseguiu enxergar através de Picasso e não mediu suas palavras em suas memórias.
“Ele estava sempre promovendo discórdia entre as pessoas ao seu redor, jogando uma mulher contra a outra, um negociante de artes contra outro, um amigo contra outro. Ele era mestre em usar uma pessoa como um trapo vermelho e a outra como um touro. Enquanto o touro atacava o trapo vermelho, Pablo era capaz de desferir golpes violentos.”
Françoise Gilot foi a única mulher a deixar Picasso – o que ele nunca perdoou. Por muito tempo, o pintor inclusive se recusou a reconhecer a paternidade de seus filhos com ela.
Picasso humilhava suas mulheres sempre que podia – também em sua arte. Dora Maar, que era considerada mentalmente instável e sofria principalmente com os insultos do artista, provavelmente será para sempre lembrada como a “mulher que chora”. Foi assim, afinal, que ele a retratou em suas pinturas.
Atração e repulsa: a relação com todas as amantes de Picasso seguiu quase sempre o mesmo padrão, diz o diretor do Museu Picasso de Münster, Markus Müller, que, junto com Marilyn McCully, publicou em 2022 o livro Picasso: Mulheres de sua vida. Uma homenagem.
“A filha de Picasso, Maya, certa vez me disse que Picasso deixou suas esposas como alguém que sai à noite para comprar cigarros no bistrô.”
Um reflexo da época?
Tal misoginia e desprezo pelas mulheres é também uma expressão daquela época – e nisso Picasso não estava sozinho. “Sua amizade com os poetas Apollinaire e Paul Éluard aponta semelhanças nesse respeito. Tanto Apollinaire quanto Éluard e Picasso são erotomaníacos e obcecados por sexo”, diz Müller.
Talvez isso também explique por que, independente da idade de Picasso, a maioria de suas novas esposas tinha menos de 30 anos quando eles se conheciam, e às vezes nem mesmo eram maiores de idade.
No mais tardar desde o movimento global #MeToo, Picasso passou a ser visto no mundo da arte como um macho obcecado pelo sucesso. Hoje, alguém como ele provavelmente seria descrito, sem pestanejar, como um exemplo de masculinidade tóxica.

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Filarmônica de Pasárgada faz música para crianças sem dar lição de moral em álbum malcriado e questionador

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Agendado para 9 de outubro, o disco da banda paulistana tem participação de Tom Zé e do escritor Ignácio de Loyola Brandão ao longo de nove faixas. A banda paulistana Filarmônica de Pasárgada segue a cronologia de um dia na vida de uma criança nas nove faixas do álbum ‘Música infantil para crianças malcriadas’
Edson Kumakasa / Divulgação
Capa do álbum ‘Música infantil para crianças malcriadas’, da Filarmônica de Pasárgada
Arte de Guto Lacaz
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Música infantil para crianças malcriadas
Artista: Filarmônica de Pasárgada
Cotação: ★ ★ ★ 1/2
♪ Sempre houve certa espirituosidade na música da Filarmônica de Pasárgada que parece até natural que o quinto álbum da banda paulistana, Música infantil para crianças malcriadas, seja disco direcionado para o público infantil.
No mundo a partir da próxima quarta-feira, 9 de outubro, o álbum reúne nove canções compostas e arranjadas por Marcelo Segreto. Gravado de 12 a 23 de março no estúdio da gravadora YB Music, em São Paulo (SP), Música infantil para crianças malcriadas consegue ser um disco lúdico e ao mesmo tempo conceitual e, em alguns momentos, até provocador.
As nove músicas seguem a cronologia de um dia na vida de uma criança do momento em que ela acorda (mote da faixa inicial Despertador) até a hora de dormir e sonhar – assunto da marchinha Tá na hora de dormir e de Sonho, a faixa final, aberta com o texto O menino que vendia palavras, na voz do escritor Ignácio de Loyola Brandão – em sequência que faz o disco roçar os 20 minutos. Ou seja, com faixas ágeis e curtas, Música infantil para crianças malcriadas é álbum moldado para a impaciente geração TikTok.
Entre o despertar e o sonho, o inédito repertório de Marcelo Segreto aborda a ida para a escola, o almoço, a lição de casa e a hora do banho. Só que inexiste no álbum aquele didatismo tatibitate e moralizante da maioria dos discos infantis. Ao contrário.
A canção O alface é infinito, por exemplo, versa sobre almoço com a participação de Tom Zé sem endeusar a dieta das folhas. Escola pode escandalizar educadores e pais mais ortodoxos com os versos finais “A gente atrasa / E quando a gente tá doente / Que beleza, minha gente / A gente fica em casa”.
Já pro banho encena diálogo de mãe e filho para mostrar a resistência da criança em se lavar com a verve de versos questionadores como “Por que os franceses podem e eu não posso? / E, além disso, olha onde é que eu moro / Em São Paulo eu tomo banho de cloro”.
Enfim, a Filarmônica de Pasárgada resiste à tentação de educar as crianças – tarefa mais adequada para pais e professores – neste disco malcriado que, por isso mesmo, tem lá algum encanto.
O álbum infantil da banda é tão abusado que até o projeto gráfico de Guto Lacaz descarta as cores recorrentes nas capas e encartes de discos para crianças para ser fiel à estética em preto e branco da discografia da Filarmônica de Pasárgada.
Filarmônica de Pasárgada lança o álbum ‘Música infantil para crianças malcriadas’ em 9 de outubro, em edição da gravadora YB Music
Edson Kumakasa / Divulgação

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Zizi Possi enfrenta ‘temporais’ de Ivan Lins e Vitor Martins em disco que traz também músicas de Gabriel Martins

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Fabiana Cozza, Leila Pinheiro e Rita Bennedito também integram o elenco feminino do EP ‘Elas cantam as águas’, previsto para ser lançado em 2025. ♫ NOTÍCIA
♪ Iniciada em 1974, a parceria de Ivan Lins com o letrista Vitor Martins se firmou ao longo das décadas de 1970 e 1980 nas vozes de cantoras como Elis Regina (1945 – 1982) e Simone, além de ter embasado a discografia essencial do próprio Ivan Lins.
Uma das pedras fundamentais da MPB ao longo destes 50 anos, a obra de Ivan com Vitor gera frutos. Previsto para 2025, o disco Elas cantam as águas reúne seis gravações inéditas.
Três são abordagens de músicas de Ivan Lins e Vitor Martins. As outras três músicas são de autoria do filho de Vitor, Gabriel Martins, cantor e compositor que debutou há sete anos no mercado fonográfico com a edição do álbum Mergulho (2017).
No EP Elas cantam as águas, Zizi Possi dá voz a uma música de Ivan e Vitor, Depois dos temporais, música que deu título ao álbum lançado por Ivan Lins em 1983 e que, além do autor, tinha ganhado registro somente do pianista Ricardo Bacelar no álbum Sebastiana (2018).
Fabiana Cozza mergulha em Choro das águas (Ivan Lins e Vitor Martins, 1977), canção que já teve gravações de cantoras como Alaíde Costa, Tatiana Parra e a própria Zizi Possi. Já Guarde nos olhos (Ivan Lins e Vitor Martins, 1978) é interpretada por Adriana Gennari.
Da lavra de Gabriel Martins, Chuvarada – parceria do compositor com Belex – cai no disco em gravação feita por Leila Pinheiro (voz e piano) com a participação de Jaques Morelenbaum no toque do violoncelo e com produção da própria Leila, que também assina com Morelenbaum o arranjo da faixa que será lançada em 11 de outubro como primeiro single do disco.
Já Rita Benneditto canta Plenitude (Gabriel Martins e Carlos Papel). Completa o EP a música Filha do Mar [Oh Iemanjá], composta somente por Gabriel Martins e com intérprete ainda em fase de confirmação.
Feito sob direção musical de Gabriel Martins em parceria com a pianista, arranjadora e pesquisadora Thais Nicodemo, o disco Elas cantam as águas chegará ao mercado em edição da gravadora Galeão, empresa derivada da Velas, companhia fonográfica independente aberta em 1991 por Ivan com Vitor Martins e o produtor Paulinho Albuquerque (1942 – 2006).

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Médico que ajudou a fornecer cetamina a Matthew Perry se declara culpado por morte do ator

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Conhecido por atuar em ‘Friends’, Matthew Perry morreu em outubro de 2023 por overdose. Mark Chaves é uma das cinco pessoas que enfrentam acusações federais pela morte do ator Matthew Perry
Mike Blake/Reuters
O médico Mark Chavez se declarou culpado por fornecer cetamina ao ator Matthew Perry, morto por overdose em outubro de 2023. O americano fez sua declaração nesta quarta-feira (2), no tribunal federal de Los Angeles (EUA), e se tornou a terceira pessoa a admitir culpa pela morte do ator, que ganhou fama ao interpretar Chandler em “Friends”.
Até a conclusão da sentença, Chavez está livre sob fiança. Ele concordou em entregar sua licença médica. Seu advogado, Matthew Binninger, havia dito em 30 de agosto que ele estava arrependido e tentava “fazer tudo para corrigir o erro”.
Além de Chavez, há dois envolvidos na morte de Perry: Kenneth Iwamasa, assistente do ator, e Erik Fleming, outro fornecedor de droga.
Perry foi encontrado morto em uma banheira de hidromassagem. Quem achou seu corpo foi Iwamasa, que morava com ele.
O assistente admitiu que várias vezes injetou cetamina no ator sem treinamento médico, inclusive no dia de sua morte. Já Fleming alegou ter comprado 50 frascos de cetamina e repassado para Iwamasa.
A Justiça americana ainda investiga mais duas pessoas: Salvador Plasencia, outro médico, e Sangha, suposta traficante conhecida como “Rainha da Cetamina”.
O ator Matthew Perry, morto aos 54 anos, em imagem de 2009
Matt Sayles, File/AP
Um ano antes de morrer, Perry havia lançado sua autobiografia: “Friends, Lovers and the Big Terrible Thing”.
“Existe um inferno”, escreveu Perry, no livro, que narra sua luta contra a dependência química durante os últimos anos de gravação de “Friends”. “Não deixe ninguém lhe dizer o contrário. Eu estive lá; isso existe; fim de discussão.”
O ator, que, na época do vício, passou pela clínica de reabilitação, havia dito que já se sentia melhor e queria que o livro ajudasse as pessoas.
Médio Mark Chavez e Matthew Perry.
Robyn Beck / AFP e Willy Sanjuan/Invision/AP

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