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Como o Restart antecipou lógica de influenciadores e fez calça colorida virar símbolo de uma geração

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Nos anos 2010, banda adotou visual vibrante como estratégia de marketing e conseguiu sair do circuito independente com superexposição na internet; ouça podcast. Restart fala sobre as calças coloridas, que marcaram identidade visual da banda
Numa época em que pouco se falava sobre música com identidade visual, quatro adolescentes vestiram calças coloridas e mudaram radicalmente a aparência do rock no Brasil.
No início dos anos 2010, o Restart foi o representante máximo do Happy Rock, nome que se deu a uma geração de bandas marcadas pelos cabelos espetados e as roupas de cores vibrantes.
“Muita gente não lembra dos nossos rostos ou de músicas específicas, mas lembra da banda das calças coloridas”, brinca Pe Lu, um dos vocalistas do grupo, que viajará numa turnê de reencontro a partir do dia 7 de outubro. Ao lado do guitarrista Koba, ele falou da série de shows no g1 Ouviu, podcast e videocast de música do g1 (ouça o podcast abaixo).
Nos palcos, o Restart vai relembrar não só a estética (agora adaptada aos integrantes e fãs adultos), mas também o som alegre e as letras juvenis de hits como “Levo Comigo”, “Menina Estranha” e “Recomeçar”.
O quarteto ainda estava na escola quando se conheceu e montou uma banda de emocore, o rock emotivo que bombava na geração anterior. A C4 surgiu em 2008, reproduzindo o estilo de grupos como NX Zero e Fresno.
Com o emo já enfraquecido, os quatro amigos decidiram no ano seguinte reinventar a sonoridade da banda. Assim nasceu o Restart, mais próximo do som de power pop e pop punk feito por nomes como Cobra Starship, All Time Low e Cash Cash.
O visual também passou a ser inspirado nesses grupos, mas ganhou a versão exagerada, que mais tarde se consolidou, por uma estratégia de marketing do grupo.
A banda Restart em 2023
Rodrigo Takeshi
“Em São Paulo, tocávamos muito em mini festivais de casas independentes. Eram dias de shows com 20 bandas, todas com repertórios parecidos. As roupas coloridas eram uma tentativa de fazer com que as pessoas lembrassem de nós”, lembra Pe Lu.
A partir de um ensaio fotográfico em que o grupo aparece com os looks vibrantes, os fãs passaram a imitar. “Criou-se um senso de comunidade”, diz o cantor. “As calças criaram uma força geracional, extrapolaram da lógica da banda.”
“Quem não conhece a história do Restart acha que a gente nasceu de uma estratégia de marketing. criada por outras pessoas Mas, na verdade, nós mesmos criamos uma estratégia que funcionou, sem perceber.”
Uma legião de crianças e adolescentes foi atraída pelas cores e o som dos garotos. Em 2010, uma sessão de autógrafos marcada em uma livraria da Avenida Paulista, em São Paulo, precisou ser cancelada por causa do número de fãs presentes, muito acima do esperado. Foi o nascimento do meme “puta falta de sacanagem”, frase dita por uma menina aos prantos na ocasião, que se tornou símbolo daquela era.
Para passar de atração escondida em cartazes de festivais independentes a boyband onipresente no rádio e na televisão, o Restart usou artifícios que — à época não era possível prever — se tornariam leis do show business.
Restart relembra episódio que virou o meme “puta falta de sacanagem”
“As pessoas enxergam o Restart como um fenômeno de fãs e isso tem um motivo. Nós aparecemos no começo das redes sociais, usamos as redes para gerar uma conversa coletiva que fez as pessoas se aproximarem”, conta Koba.
As redes eram, em resumo, o Orkut e o MySpace, antecessores do Instagram e do Facebook nos corações e mentes de internautas brasileiros. Ainda não existiam influenciadores — ou, pelo menos, eles não eram chamados assim. Mas os integrantes da banda já montavam calendários de postagens e mostravam seu dia a dia em vídeos (que, mais tarde, se tornariam os “vlogs”).
“Essa é uma troca importante no mercado, do artista que era inalcançável e passou a ser hiper alcançável. O artista que só existe na televisão não era mais o que as pessoas queriam consumir. Elas queriam poder palpitar na sua música”, analisa Pe Lu.
Pioneiros do ‘hate’
Pe Lu, Koba, Pe Lanza e Thomas no auge do Restart, em 2010
Divulgação
Os palpites chegavam aos montes, às vezes de formas agressivas. Da mesma forma que antecipou a cultura de influenciadores, o Restart foi pioneiro em receber “hate” na internet do país. “Chegou um momento em que lidar com as críticas virou quase um esporte”, brinca Koba.
O grupo chegou a ser vaiado ao ganhar cinco prêmios por votação popular no VMB de 2010. “Tivemos 2 milhões de votos na premiação, mas tinham ali 300 pessoas que eram fãs de outros artistas e estavam numa lógica de torcida de futebol”, recorda Pe Lu.
“Criou-se uma lenda de que o Restart foi muito odiado, mas essa é uma análise posterior. Na verdade, nós fomos muito mais gostados.”
Banda Restart será entrevistada no g1 Ouviu ao vivo
Rodrigo Takeshi/Divulgação
Com fãs que os seguiam por todo lugar, eles viveram o início da vida adulta como astros do rock, que, em vez de cuspirem para a câmera, a adotaram como instrumento de trabalho. A superexposição fazia de qualquer ida a um restaurante um complexo trabalho de logística, para evitar aglomerações perigosas em torno dos integrantes.
“No começo a gente se divertia muito”, diz Koba. “Mas teve um momento em que não conseguíamos mais ir a um shopping, por exemplo, e isso dá uma pirada na cabeça. Você perde o contato com a vida normal, e isso te distancia das pessoas.”
Pe Lu reflete sobre o auge: “A proximidade com a vida real mantém a sua cabeça no lugar certo, emocionalmente. Esse afastamento, além de solitário, é irreal porque, no fim das contas, todo mundo é um CPF.”

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