Nada menos do que três composições de Antonio Carlos Jobim foram feitas com inspiração em tramas do escritor, morto ontem aos 75 anos. ♪ MEMÓRIA – Ocorrida na noite de ontem, a morte de Gilberto Braga (1º de novembro de 1945 – 26 de outubro de 2021) aos 75 anos reacendeu a memória e a nostalgia dos internautas noveleiros.
Assim que a notícia foi difundida, as redes sociais ficaram repletas de lamentações pela morte do escritor e de celebrações do legado deixado pelo novelista para a teledramaturgia brasileira com novelas, séries e especiais escritos entre 1973 e 2015.
A vasta contribuição de Gilberto Braga à cultura nacional se estende ao campo musical. As novelas e séries do escritor também legaram feitos para a música brasileira com trilhas sonoras que, além de belas, fizeram história na MPB.
Basta dizer que, inspirado por tramas criadas por Gilberto Braga, o soberano Antonio Carlos Jobim (1927– 1994) – o compositor preferido do novelista, cabe ressaltar – fez nada menos do que três músicas para novelas e série de Gilberto Braga, sendo que duas são dignas de figurar em qualquer antologia de Jobim.
A primeira foi a valsa Luíza, composta por Jobim há 40 anos para a abertura da novela Brilhante (1981), terceira trama escrita por Gilberto Braga para o horário nobre das 20h da TV Globo.
Cinco anos depois, quando o escritor abordou o preconceito e a hipocrisia da década de 1950 na série Anos dourados (1986), Jobim compôs o bolero também intitulado Anos dourados. O tema foi ouvido em versão instrumental na abertura da série. Somente quando a série já tinha sido exibida é que ficou pronta a letra escrita por Chico Buarque e lançada por Maria Bethânia no álbum Dezembros (1986).
Passados mais cinco anos, Tom Jobim criou a canção Querida para a abertura de O dono do mundo (1991), uma das novelas mais controvertidas da carreira de Gilberto Braga.
Admirador dos grandes compositores e intérpretes da música brasileira, o novelista sempre deu voz a grandes nomes da MPB à medida em que foi ganhando autonomia para interferir nas trilhas sonoras das novelas e séries.
Foi na já citada novela Brilhante (1981) que o Brasil ouviu pela primeira vez a última gravação de Elis Regina (1945 – 1982), Me deixas louca (1981), versão em português, escrita por Paulo Coelho, do bolero Me vuelves loco, standard do compositor mexicano Armando Manzanero. (1934 – 2020).
Um ano antes, a novela Água viva (1980) entrou na onda musical do autor e da MPB, propagando em escala nacional gravações como a de Wave (Antonio Carlos Jobim, 1967), feita por João Gilberto (1931 – 2019) três anos antes para o álbum Amoroso (1977).
Contudo, nada pode ser comparado, antes ou depois, com o impacto provocado na música do Brasil pela trilha sonora nacional da novela Dancin’ days (1978), estreia do escritor no prestigiado horário das 20h.
Gravada pelo grupo As Frenéticas para a abertura da novela, a música Dancin’ days (Ruban Barra e Nelson Motta) se tornou um hino nas pistas das discotecas, extrapolando a tela da TV, ganhando as rádios, conquistando o Brasil e fazendo até cantores então distantes do universo da disco music, como Belchior (1946 – 2017) e Ney Matogrosso, flertarem fugazmente com o gênero.
Nessa pista, cabe mencionar o sucesso efêmero de Kitsch zona sul (Lincoln Olivetti, Robson Jorge e Ronaldo Resedá, 1978), música que deu impulso à carreira de cantor do ator e bailarino Ronaldo Resedá (1945 – 1984) e que traduzia a atmosfera da juventude carioca retratada por Gilberto na trama estrelada por Sônia Braga.
Entre temas inéditos, a trilha sonora de Dancin’ days também rebobinou, a pedido de Gilberto, uma das muitas gravações de Copacabana (Braguinha e Alberto Ribeiro, 1946) feitas pelo cantor Dick Farney (1921 – 1987), intérprete original do emblemático samba-canção.
E, como todo bom escritor gravita em torno de um universo particular, Maria Bethânia regravou quase 30 anos depois um outro samba-canção situado na mesma praia, Sábado em Copacabana (Dorival Caymmi e Carlos Guinle, 1951), para ser o tema de abertura da novela Paraíso tropical (2007).
Embalada pela voz de Bethânia, a trama foi outro sucesso popular de Gilberto Braga, novelista que amava música e que, por isso mesmo, também contribuiu para difundir a riqueza da MPB enquanto dava vida e voz a vilãs e heroínas inesquecíveis nas telas da TV Globo.