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Joyce Moreno se alimenta do amor pelo balanço e a bossa no álbum autoral ‘Brasileiras canções’

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Dueto com Mônica Salmaso em ‘Tantas vidas’ e participação do guitarrista Chico Pinheiro em ‘Não deu certo (mas foi divertido)’ são destaques do disco que apresenta 12 canções inéditas da artista. Capa do álbum ‘Brasileiras canções’, de Joyce Moreno
Reprodução
Resenha de álbum
Título: Brasileiras canções
Artista: Joyce Moreno
Edição: Biscoito Fino
Cotação: ★ ★ ★ ★ ½
♪ Joyce Moreno é do balanço e da bossa. No tema sem letra Não deu certo (mas foi divertido), uma das 12 músicas inéditas do álbum Brasileiras canções, a artista carioca cai na swingueira – ao lado do violonista e guitarrista paulistano Chico Pinheiro, convidado da faixa – ao longo de três minutos e meio sem perder o pique do violão e dos vocalises.
O tema é um dos pontos luminosos do disco que chega ao mundo na sexta-feira, 5 de agosto, em edição da gravadora Biscoito Fino, com capa que traduz na ilustração a carioquice universal do violão dessa instrumentista de notórias habilidades.
Contudo, Joyce Moreno é também das canções que brilham como luzes no céu do Brasil, como a compositora poetiza na música-título Brasileiras canções, outro título cintilante do repertório inteiramente autoral. Joyce é das canções de sensibilidade feminina, da cor brasileira.
E, por ironia, são de um homem – o poeta e letrista português Tiago Torres da Silva – os versos de Tantas vidas, única música do disco que explicita o gênero feminino do eu-lírico da canção.
“Não há mulher por mais feia / Que não veja como é linda / Quando se sente bem-vinda / No coração que ela adora”, sublinha a autora da melodia, dando voz a versos repartidos com Mônica Salmaso, convidada da faixa. Em tom menos solene do que o habitual, Salmaso se aclimata na serenidade assertiva da composição.
Anunciado oficialmente pelo single editado em 15 de julho com o viçoso samba Todo mundo, o álbum Brasileiras canções tem sonoridade sustentada pelo entrosado quarteto formado por Joyce Moreno (voz e violão) com Hélio Alves (piano), Jorge Helder (baixo) e Tutty Moreno (bateria).
Mas entram eventualmente outros sons e instrumentos. O acordeom de Paris e eu remete ao universo das chansons francesas na gravação dessa composição bilíngue cuja letra foi construída com base nas afinidades entre os versos em francês e em português da música.
O sopro do mar é faixa bafejada pelo eterno frescor da bossa entranhada na alma musical de Joyce Moreno, cria da praia de Copacabana, carioca que bebeu da mesma fonte límpida sorvida por colegas parceiros como o pianista Marcos Valle.
Como a bossa absorveu a tal influência do jazz, o buliçoso samba Carnaval é mesmo assim cai na folia do samba-jazz em passagens instrumentais que atestam a fina sintonia entre os músicos do álbum gravado em março no Rio de Janeiro (RJ), no estúdio da gravadora Biscoito Fino.
Em Quem nunca?, a artista estabelece com Alfredo Del-Penho um diálogo cúmplice ao fazer o inventário das ações incertas da vida, sem cravar certezas. A única certeza é a da morte, cuja natureza é discutida com Moacyr Luz, parceiro e convidado (opaco) do samba-choro A morte é uma invenção.
“A morte é uma fronteira / Apenas baldeação”, crava Joyce, seguidora da doutrina espírita kardecista, na letra escrita em dezembro de 2019 antes da pandemia de covid-19 ceifar milhões de vida ao redor do mundo.
Entre as quebras sinuosas de A palavra exata, samba que tangencia o jazz à beira do precipício, e as questões filosóficas feitas na atmosfera de samba-canção em Nas voltas do tempo, faixa (sublinhada pelo piano de Hélio Alves) em que Joyce versa sobre delicadas equações entre o coração e o amor gerador de saudade sem fim, paira a força soberana do amor universal.
“Meu amor é meu alimento e farol / Meu perdão, meu consentimento total / Minha cruz, meu desprendimento / Meu encantamento / Meu fervor, meu guia”, relaciona Joyce Moreno na introspectiva balada Alimento, outro ponto luminoso de álbum vigoroso em que os traços determinantes da obra da artista se impõem.
Essa imposição é feita com a mesma musicalidade – de sofisticação maturada pelo tempo – observada em Natureza, o ainda inédito álbum gravado por Joyce em 1977 com produção musical e arranjos do maestro alemão Claus Ogerman (1930 – 2016) e programado para ser lançado em setembro após 45 anos.
As palavras e os sons do álbum Brasileiras canções reiteram a personalidade singular de Joyce Moreno, artista do balanço, da bossa e, sim, das canções.

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