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‘É necessário estar aqui e ocupar este espaço’, diz Natália Lara, narradora da Copa pelo SporTV

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Ela começou em web rádio com só dois ouvintes (os pais dela) e diz que esta é a 1ª vez que mulheres serão representadas. g1 conta histórias das profissionais que vão cobrir a Copa em 2022. Uma situação recorrente tem chamado atenção da Natália Lara, escalada para narrar a Copa do Catar pelo SporTV. “Recebo mensagens de meninas, ou de pessoas, dizendo que pareço com uma amiga”, afirma.
“Às vezes são só os óculos ou o cabelo. Pela primeira vez essas pessoas estão olhando para a TV e falando ‘nossa, ela se parece comigo’.”
Segundo ela, a sensação é de representatividade. “A gente está impactando de qualquer forma, porque as próximas gerações vão crescer em um mundo onde isso existe, a presença da mulher como algo normal”, afirma.
Nesta semana, o g1 conta histórias das profissionais que vão cobrir a Copa em 2022. Veja, de segunda a sábado, entrevistas com comentaristas e narradoras que você já ouviu ou vai ouvir durante os jogos no Catar.
Única na classe
O sonho de Natália era ser jogadora de futebol. Jogava com os meninos mesmo, e jogava bem. Recebeu dos amigos o apelido de Formiguinha, em homenagem à ex-jogadora Formiga, que está no time de comentaristas da Globo na Copa do Catar. “Queria fazer escolinha, mas, infelizmente, perto de casa, a única que existia era só para meninos, aquela famosa história que a gente já sabe”, conta. “Eu fui jogando até onde o joelho deixou.”
Natália Lara ao lado de Formiga e Renata Mendonça
Reprodução/Instagram
Ainda na faculdade de Rádio e TV, uma professora alertou para o talento em narração, mas ela só foi buscar a área com mais afinco depois de formada, por causa do estágio em uma TV, em que se enfiava na sala de locução. A função não tinha nada a ver com isso, mas ela foi se arriscando.
A Seleção Brasileira de futebol feminino, eliminada das Olimpíadas no Rio em 2016, também fez parte dessa história.
“Já era 2017, e isso estava muito fresco na minha cabeça. Pensei comigo, se trabalhasse com esporte, de repente, dava para fazer diferença para essas mulheres.”
Naquela época, já formada e com cursos de locução no currículo, ficou sabendo que teria início um para a área esportiva. Decidiu se inscrever. Natália era a única mulher da classe.
“Quando o professor, o [Renato] Rainha, entrou na sala e me viu, ficou muito feliz, empolgado mesmo, e isso tirou toda a minha tensão”, lembra. “Ele disse que ia ser muito legal eu estar ali, que tinha de saber não ia ser uma área fácil, mas o que pudesse fazer para ajudar, ele faria. E os meninos da sala, todos eles, queriam ajudar. Foi uma energia muito legal.”
Energia tão boa que, cerca de seis meses depois, um deles a chamou para o Panamericano Universitário, primeiro trabalho efetivo dela na narração. “As pessoas que eu fui encontrando no caminho tinham essa energia de ‘que legal, vamos em frente.'”
“Eu tive muito apoio. Até meus pais que viam que estava difícil de chegar, de sair de onde eu estava, trabalhar de graça. Eles me empurravam para frente para não deixar a famosa peteca cair.”
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Rádio com dois ouvintes
A família de Natália acompanhou todos os passos da filha. O pai é ligado no esporte, só que a mãe também fica atenta às transmissões.
“Até o sorteio da Copa do Mundo Feminina de 2023, às 3 e meia da manhã, minha mãe estava mandando mensagem. Os dois estavam assistindo, e é muito legal porque eles acompanham desde o princípio.”
Natália Lara, Renata Mendonça e Paulo César Vasconcellos na transmissão do sorteio da Copa do Mundo Feminina de 2023
Reprodução/Instagram
Pouco tempo antes, Natália começava a narrar jogos em uma web rádio, que nem sempre dava audiência. “Era difícil. Apesar do crescimento na internet, as menores dependem de engajamento, e muitas vezes só têm uma ou duas pessoas ouvindo.”
“Muitas das minhas transmissões aconteciam comigo sentada no sofá da sala, meu pai ouvindo em um cômodo de um lado, e minha mãe do outro, sendo os únicos que estavam ouvindo.”
Narração inesquecível
Ela conta que as transmissões nas webs rádios foram importantes e deu a ela a experiência que precisava para encarar desafios que viriam depois. A primeira grande narração, com público, foi em 2018, na Copa América feminina. “Ali foi o primeiro jogo, nas redes sociais da CBFTV. Futebol feminino foi a minha motivação no início de carreira, então, foi uma realização muito grande.”
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A partida pela qual ficou responsável seria a do título, o que aumentou o nervosismo. “Sabia que além de fazer a narração do jogo, teria que fazer o pós-jogo.”
“Tive uma preparação para além do que eu já tinha de conhecimento de futebol feminino, mas também uma preparação mental de que esse momento chegaria. Eu ia poder dizer que a Marta, que na época era a capitã, ia levantar a taça.”
Dali, ela já passou a fazer as transmissões do Brasileirão feminino pelo Twitter da CBFTV, onde ganhou mais espaço. “Estava realmente transmitindo para um público maior, com outros formatos, pessoas diferentes. Era outra vivência, com um peso maior por ser a rede social oficial do campeonato.”
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Chaves e RuPaul’s Drag Race
Como todo narrador, Natália também tem bordões. “No começo da carreira, eu até ficava pensando neles, achava que precisava ter”, diz. A maioria, ela conta, saiu espontaneamente.
Um deles foi inspirado, sem querer, em “Chaves”, programa do qual é muito fã. Ela diz que foi em um jogo da série B quando teve uma bola isolada [quando o zagueiro chuta a bola com força para longe]. “Eu brinquei ‘já se foi o disco voador!'”, diz. “Um tempo depois, viralizou. Achei engraçado, usei em outros jogos e, do nada, estourou.”
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Já “Professor, anota que é dele/dela”, tem uma história mais elaborada, de quando cobriu futsal no Panamericano Universitário. “A gente costuma chamar o árbitro de professor”, conta ela. Naquele campeonato, precisava ir até o mesário para pegar os nomes escalados pelos times. “Aí, eu pedia, ‘professor, já tem as escalações?’, e eles respondiam: ‘anota aí’. Isso ficou na minha cabeça e pensei em testar.”
Tem também influência do reality “RuPaul’s Drag Race”, com o bordão “the library is open” [a biblioteca está aberta, em tradução literal], que virou “a chapelaria está aberta” para toda vez que um jogador dá um chapéu em outro.
“Estava assistindo a série e pensei que de repente pudesse ser divertidinho. Levar um pouco da cultura drag para os homens é bom de vez em quando.”
Natália Lara na Granja Comary, em 2021, para narrar evento em homenagem às pioneiras da Seleção Brasileira
Reprodução/Instagram
Mais visibilidade
Como todas as mulheres que se arriscam na narração ou nos comentários de futebol, ou em esporte em geral, ela também recebe críticas, e desde o início e em todos os lugares por onde passou.
Com o tempo, e depois de entrar para o time da Globo, quando ganhou maior visibilidade, ela diz que mudou a forma como enxergá-las. “Converso muito com as meninas, com a Ana Thaís, com as Renatas [Silveira e Mendonça], e sei que elas passam por coisas parecidas, ou piores ou mais brandas. Isso faz parte do nosso dia a dia.”
Renata Silveira, Renata Mendonça, Ana Thaís e Natália Lara, escaladas para a cobertura da Copa do Catar
Reprodução/Instagram
Natália diz que, por consequência, mudou seu comportamento nas redes sociais. Hoje, elas são menos atualizadas, com publicações pontuais sobre os jogos que vai narrar ou para compartilhar um vídeo que gostou, por exemplo.
“Mudei minha relação com elas, mas a quantidade de contas bloqueadas pós-jogo de futebol masculino, principalmente, é grande. É bem difícil a gente passar ilesa, não só comigo, mas com as outras mulheres também.”
Time feminino na cobertura da Copa do Catar
Reprodução/Instagram
O prognóstico, no entanto, é mais positivo. Um dos momentos que marcou Natália foi um vídeo que recebeu de uma jornalista. Na gravação, a filha da mulher, de 3 ou 4 anos de idade, brincava com bonequinhos que jogavam futebol. “A menina que narrava a partida”, conta.
“As próximas gerações vão crescer em um mundo onde isso existe, onde a presença da mulher é algo normal.”
Ela afirma que ainda existem atrasos nesta questão, mas já foi possível conquistar muito desde 2018, quando as mulheres começaram a entrar no mercado. “A gente faz muito bem-feito, a gente se prepara, às vezes a gente tem que se preparar muito mais”, afirma. “Mas realmente é necessário. É necessário a gente estar aqui, é necessário ocupar esse espaço, e a tendência é [ocupar] cada vez mais.”
“Se a gente não está fazendo tanta diferença quanto gostaríamos agora, faz parte do processo. Estamos fazendo muito mais do que em 2018, mais do que em 2019 e por aí vai. Essa Copa do Mundo vai ser marcante, é um divisor mesmo.”
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